Todo mundo conhece alguma Rhanna Diógenes, ou, como a violência machista está no nosso cotidiano

Violência contra a mulher é tema recorrente por aqui, seja por conta das mobilizações acontecidas no Brasil com as Marchas das Vadias ou debatendo a questão da violência doméstica e a Lei Maria da Penha, óbvio que é um tema recorrente para o movimento feminista e para as mulheres em geral, somos abusadas, estupradas e espancadas todos os dias por desconhecidos, pais, irmãos, namorados, maridos, primos, amigos, etc. E provavelmente neste mês que segue deverá povoar muito mais este espaço coletivo, pois começa a contagem regressiva para o 25 de novembro, dia latino-americano e caribenho do combate à violência contra a mulher.

Já faz um tempo nas redes sociais que vem sendo divulgado o caso da estudante Rhanna Diógenes agredida em uma boate em Natal/RN e teve o braço quebrado por se recusar a ficar com um rapaz na balada, esta semana o caso teve mais repercussão por conta de uma matéria no Fantástico, até interessante, pois tratava da violência contra as mulheres nas baladas no país todo e não de uma forma isolada e nem questionando a como a vítima estaria dançando ou vestida na balada, como muitas vezes acaba se fazendo por aí, culpabilizando a vítima pela ação violenta do agressor.

Ao tratar o assunto de forma mais global, apesar de se limitar apenas as violências nas baladas, se coloca um debate importante de qual o lugar que até hoje a mulher ocupa na sociedade, debate antigo, mas que se faz cada vez mais atual. É só lembrarmos do caso no final do ano passado a estudante da PUC/RS que foi abusada por diretores do DCE da universidade durante as eleições para delegadxs ao 52º CONUNE, ou até mesmo os diversos casos de estupros e agressões no metrô de São Paulo que tem esta semana como principal exemplo o caso do advogado Walter Dias Cordeiro Junior que abusou de uma jovem de 21 anos na linha vermelha do metrô paulistano.

No final de 2004, o Metrô realizou uma pesquisa com usuários, que entre outros quesitos, avaliou as ações da companhia para prevenir o assédio sexual nos trens.
Para 21%, nada era feito -serviço considerado inaceitável-; 45% disseram que a companhia só agia quando a vítima conseguia informar um funcionário -nível considerado inadequado.
Sete anos depois, o Metrô diz não dispor de dados atualizados sobre níveis de satisfação (ou insatisfação) em relação à prevenção de assédio. (CAPRIGLIONE, Laura e FLORÊNCIA, Olívia. Assediada no metrô ataca o “Zorra Total”)

Estes três casos não são acontecimentos isolados, são a demonstração real de como o machismo é entranhado em nossa sociedade, e como não há política pública efetiva para combater o machismo nas ruas, escolas, transportes públicos e baladas. Fora o fato de normalmente tratarem casos de violência machista como patologia.

A imagem do estuprador como a de um “serial killer”, ou seja, uma personalidade psicótica ou perversa, que vai atacar independente de quantas campanhas sejam feitas, que não tem cura nem tratamento, ajuda a perpetuar essa justificativa: se se trata de um “animal”, logo, cabe à vítima se prevenir, não “provocando” os instintos irrefreáveis do “monstro”, ou seja, não saindo sozinha, não se vestindo de forma provocativa, não conversando com desconhecidos, coisas do gênero (falando claramente: sendo uma moça comportada)

Contudo, a maioria do estupros é praticada por pessoas que conhece a vítima, e que muitas vezes com ela tem até relações de intimidade. O crime é cometido por pessoas que não são “monstros”. Que, ao serem acusados de estupro, se defendem e são defendidos, pela sociedade em geral, como sendo “pais de família, honestos, trabalhadores, decentes, religiosos, bons filhos, bons maridos” etc, et al, ad nauseam. (LIMA, Renata. Campanha contra estupro causa polêmica. Por que será?)

a violência contra a mulher não é o mundo que a gente quer. Imagem de Bea, no Flickr, em CC alguns direitos reservados

Poderia ficar por aqui listando diversos casos tanto de agressões quanto de mortes de mulheres por ex-namorados, ficantes ou outras pessoas, pois é só abrir o jornal, ligar a TV ou rádio para se deparar com notícias sobre mulheres mortas por conta de crimes “passionais”. E mesmo assim parece que é coisa mínima, banal, específica e não um problema social grave, quando 10 mulheres morrem por dia no país, para mim, é grave, pois fazem parte da população economicamente ativa, ajudam a organizar o trabalho reprodutivo para manter o mercado de trabalho produtivo, são parte considerável da mão-de-obra disponível hoje em nosso país e ainda assim somos vistas como mercadoria a disposição de qualquer um que quiser passar a mão, pinto ou boca em nós, mesmo quando não queremos.

Ter capacitação de profissionais para atender mulheres em todas as situações de violência machista nas delegacias, hospitais, varas e outros locais é fundamental, assim como um programa que ajude a combater já nas escolas a naturalização da divisão sexual do trabalho e do machismo como um todo, o investimento em transportes públicos para combater a superlotação dos mesmos e assim não criar oportunidade para assédios e abusos como os que vem sendo denunciados pelo sindicato dos metroviários de São Paulo.