Texto de Regiane Arruda*

Desde pequena sabia que não podia tocar lá, principalmente na frente dos outros.
– Tira a mão daí, é feio, menina! – dizia minha mãe, apesar de nunca dizer o motivo. E eu tirava! Não sabia o porquê e também nunca questionei. E toda vez que minha mãe queria falar sobre “ela” usava outros nomes: bichinha, xana, etc…
Quando vi, já havia crescido e nunca, nunca mesmo havia dito a palavra vagina, pelo menos não em público.
Lembro-me de ficar olhando em livros de ciências a imagem do menino e da menina nus. Eu era fissurada naquelas imagens, não via à hora de chegar tal página para finalmente saber o que tanto me escondiam. Mas a professora a definiu como “órgão reprodutor” e só.
Confesso que fiquei um pouco traumatizada, eu esperava um pouco mais, algo com erupções vulcânicas… E o pior é que eu, assim como minha mãe (minha família, e todxs que conheço) não conseguia dizer a bendita palavra. Mesmo quando queria, a danada não saia de jeito nenhum da minha boca… Acho que eu tinha medo de ser mal interpretada pelas pessoas. Mas isso mudou quando li “Os Monólogos da Vagina” espetáculo teatral escrito pela autora Eve Ensler.

Ela descreveu a vagina de uma forma tão poética, tão linda, que fiquei encantada. Além de tratar de assuntos como: estupro, depilação, sexualidade, parto, de uma maneira super natural… Há uma parte no livro − uma das minhas preferidas − onde a autora entrevista uma garota de seis anos sobre sua vagina:
— Se sua vagina se vestisse, o que usaria?
— Sapatos vermelhos de salto alto e um boné dos Mets virado para trás.
— Se ela pudesse falar, o que diria?
— Diria palavras que começam com “V” e com “T” — violino e tartaruga, por exemplo.
— O que é que a sua vagina lembra?
— Um belo pêssego negro. Ou um diamante. Encontrei um tesouro e ele é meu.
— O que há de tão especial com a sua vagina?
— De alguma forma, bem lá no fundo, eu sei que ela tem um cérebro muito sabido.
— Sua vagina cheira a quê?
— Flocos de neve.

Fofo, não?
Posso dizer que minha concepção sobre vaginas mudou (pra melhor) depois que eu li essa obra fantástica que é “Os Monólogos da Vagina”.
Agora, eu necessitava falar essa palavra por aí para mostrar que a vagina não é um monstro de sete cabeças, ou algo do tipo. E então eu disse pela primeira vez a palavra na sala de aula, numa apresentação. Eu precisava discorrer sobre o assunto de um livro qualquer escolhido por mim… foi um bafafá. Eu disse a palavra uma primeira vez, e todos se entreolharam e riram como se o que eu acabara de dizer fosse um palavrão, uma piada, não sei… e eu disse de novo, e de novo. Devo ter dito “vagina” umas 30 vezes – sem exageros. E quando acabou a aula, ninguém mais se importava com a palavra que horas antes era tida como “nojenta”.
Será que não dizemos – vagina – porque não queremos ou porque somos ensinados a ignorar uma coisa que está ali presente no nosso corpo? Por que quantas mulheres já não disseram VAGINA e ficaram com aquela sensação de: opa, falei o que não devia! É normal sentirmo-nos assim, pois fomos educadxs dessa maneira. De qualquer forma, essa é uma palavra que agora, toda vez que tenho a oportunidade de dizer, digo, em alto e bom som.
*Regiane Arruda é feminista, lésbica e atéia – @giihboursier