Chacotas de Danilo Gentili contra mulher serão julgadas em Olinda

Texto de Lis Lemos e Nataly Queiroz.

A primeira audiência judicial contra o comunicador – assim ele se intitula – Danilo Gentili, que achincalhou uma mulher do interior de Pernambuco, Michele Maximino, por ser a maior doadora de leite do país, aconteceu quarta-feira (04), em Olinda. Essa é uma audiência emblemática por acontecer na semana do Dia Internacional da Mulher e por trazer à tona um tema ainda pouco explorado que é a violência simbólica contra a mulher cometida por comunicadores que ocupam preciosos espaços em concessões públicas.

Três testemunhas foram ouvidas na audiência de instrução do processo de danos morais que a técnica de enfermagem Michele Rafael Maximino, 32 anos, move contra os comediantes Danilo Gentilli e Marcelo Mansfield. O alvo da queixa é um quadro do programa “Agora é Tarde”, da Rede Bandeirantes, exibido em outubro de 2013. Na ocasião, Danilo chamou a pernambucana de “vaca” e a comparou com o ator pornográfico Kid Bengala.

A audiência de instrução começou às 13h40, com o depoimento da técnica de enfermagem. Outras duas testemunhas de Michele foram ouvidas na audiência, presidida pela juíza Regina Célia Maranhão. Estiveram presentes os advogados dos comediantes e também um defensor da Rede Bandeirantes. A audiência terminou por volta das 16h.

No dia 12 de fevereiro, o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) emitiu uma carta precatória para ouvir os dois humoristas em São Paulo. Até o momento, o documento ainda não retornou ao estado, segundo o tribunal. Somente após a resposta das cartas precatórias é que as partes fazem suas alegações finais para, então, ser marcada a data para o proferimento da sentença do caso. Referência: Testemunhas depõem em processo de doadora de leite contra Gentilli.

Doadora de leite acusa comediante de injúria e faz nova denúncia à polícia. Foto de Débora Soares / G1.
Doadora de leite acusa comediante de injúria e faz nova denúncia à polícia. Foto de Débora Soares / G1.

A violência de gênero nos meios de comunicação não é nenhuma novidade. Pelo contrário. Ela se apresenta sob a forma de imagens estereotipadas de mulheres hipersexualizadas ou de figuras cândidas, ternas prontas para servir, ou ainda no silenciamento das vozes, das opiniões e de tudo o que nos torna sujeitos no mundo. O caso de Michele Maximino é uma junção de todas essas expressões violentas a que as mulheres estão sujeitas apenas por existirem numa sociedade patriarcal, racista e homofóbica como a nossa.

Michele nada mais fez do que ser uma pessoa solidária e com disposição suficiente para viajar 80km por semana para entregar o leite materno que coletava em um banco de leite. No entanto, o apresentador, reprodutor de piadas esvaziadas, chamou-a de vaca, a comparou a um ator pornô e ainda tentou projetar eroticidade barata por meio do uso desautorizado da imagem dela amamentando. O material foi veiculado na Rede de Televisão Bandeirantes e compartilhado em redes sociais – a medida exata para destruir as vidas de uma família, que precisou abandonar emprego, casa, parentes e amigos para tentar reconstruí-las em outro município, longe das chacotas que se perpetuavam nas ruas.

Michele teve sua voz calada, sua imagem utilizada de forma vexatória, foi exposta pelo vão (e suposto) interesse de uma audiência que o apresentador alimenta, se gabando de adotar a postura do gozador da turma do fundão. Maximino buscou a justiça. Gentili foi obrigado a retirar todo o material do ar, depois de recorrer duas vezes da decisão judicial. Depois inventou um quadro cujo nome tinha a palavra “leite”, balbuciou algo sobre uma torpe “liberdade de expressão” e finge gostar de ser processado, num pacto com a mediocridade que poucos se vangloriam de ter assinado. A Rede de Televisão Bandeirantes fingiu que não era com ela e não se pronunciou sobre o assunto.

Acionar a justiça ainda é uma das poucas alternativas que restam às mulheres que são violentadas por comunicadores nas diversos mídias. Pois, em um sistema de comunicação pérfido, injusto, concentrador e antidemocrático como o que temos no Brasil, não é possível responder a esse tipo de baixaria travestida de ‘liberdade de expressão’ na mesma moeda. Mas é necessário não calar. A busca de Michele por reparação é mais que justa, é pedagógica e exemplar.

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