As mulheres e a reforma política

Texto de Barbara Lopes.

Nós temos, pela primeira vez, uma mulher na presidência da República e um número inédito de mulheres em cargos do primeiro escalão do governo federal. Isso tem uma importância real, pois a participação das mulheres na política institucional é um passo fundamental para a criação de políticas para mulheres; e também tem uma importância simbólica, ao familiarizar a sociedade com a ideia de mulheres no poder.

Senado realiza sessão solene em comemoração ao Dia Internacional da Mulher, com entrega do Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz. Foto: Wilson Dias/Agência Brasil.

Ao mesmo tempo, o Brasil continua em uma das últimas colocações em relação à presença feminina nos cargos eletivos. Há apenas 45 mulheres na Câmara dos Deputados, menos de 9% do total. Em 2010, as senadoras foram eleitas para 8 das 54 cadeiras em disputa, o que corresponde a 14%. A eleição do ano passado foi a primeira em que vigorou a lei de cotas, que garantiria um mínimo de 30% das candidaturas para mulheres. A lei foi descumprida pelos partidos e, dentro da Justiça Eleitoral, havia interpretações de que a lei seria mais simbólica do que prática e que os partidos não poderiam ser punidos por não haver mulheres interessadas em número suficiente.

Mesmo assim, houve um grande avanço no número de candidatas. Para a Câmara dos Deputados, o percentual de candidatas passou de 13% para 21%. Mas esse aumento se traduziu apenas muito modestamente nos resultados das eleições, mostrando que há outras barreiras além do acesso às candidaturas, como o acesso a recursos para a campanha e a cultura política, que dificulta a renovação dos quadros (foram reeleitos 55% dos deputados federais em 2010).

Algumas desses obstáculos podem ser enfrentados com a reforma política. A Câmara instalou uma comissão especial para discutir o assunto. Dois pontos, em especial, podem favorecer a representação feminina (e de outros grupos sub-representados): o financiamento público para campanhas e o voto em lista fechada pré-ordenada.

A lista fechada divide opiniões, pois aumenta o poder da estrutura interna dos partidos (um dos objetivos é justamente fortalecer os partidos e despersonalizar a política). Para garantir que a escolha seja democrática, é necessário atrelar a essa proposta mecanismos de participação e transparência dentro das organizações partidárias. Da mesma forma, a formação de coligações entre partidos para os cargos proporcionais, que existe atualmente, não deve mais ser permitida. A vantagem, do ponto de vista feminista, é a possibilidade de garantir a presença de mulheres ao longo das primeiras colocações da lista. É como funciona na Argentina, que já atingiu 38,5% de mulheres na Câmara dos Deputados, acima do estabelecido na cotas, mostrando que a mudança institucional fez-se acompanhar por uma mudança política.

Um texto bastante esclarecedor sobre os pontos discutidos na reforma política foi publicado no recém-extinto blog O Biscoito Fino e a Massa. No texto, Idelber Avelar defende que o financiamento público de campanha, medida que tem como objetivo inibir a corrupção e o tráfico de influência, precisa estar vinculado ao voto em lista fechada nas eleições proporcionais. Atualmente, o fundo partidário, que é público, é apenas uma pequena parte do que é usado nas campanhas, e o restante vem de doadores que podem ser pessoas físicas ou jurídicas. Uma medida aprovada em 2009 determina que 5% do fundo seja usado para formação e capacitação de mulheres. Com o financiamento público, a distribuição dos recursos se tornaria mais transparente, facilitando o cumprimento dessa determinação. Há propostas para aumentar o percentual destinado a mulheres para 30%.

Para saber mais:

» Os desafios para a ampliação da participação política das mulheres, artigo no site do CFemea

» Agenda feminina na reforma política, reportagem do R7

» Reforma política e participação, artigo de Almira Rodrigues