25 de julho, o dia das outras mulheres

Texto de Aline Dias*

Aline Dias

O racismo presente em nossa sociedade faz com que não se conheça e reconheça as mulheres negras como feministas. Somos vistas como “as outras”. A partir do momento que nossas histórias são tidas como mitos, da vivência de nossas antepassadas são lembradas apenas a dor e o sofrimento e nossas memórias são folclorizadas a ponto de serem lindas em livros de romance, mas inválidas para uma luta de resistência autenticamente feminista.

O feminismo branco dá ênfase às opressões comuns às mulheres, mas não se aprofunda nas especificidades das mulheres que estão ao redor. Dentro do feminismo, quando se diz “mulher” mesmo que a intenção seja abranger todas as mulheres, um rosto está implícito na mente das militantes feministas e esse rosto, quase nunca é negro.

Seja numa noticia de resistência, conquista ou dor e perda o rosto imaginado desenhado e representado será de uma mulher branca. Nós, mulheres negras, somos as outras. Somos as mulheres que o feminismo tenta absorver há séculos, absorver sem reconhecer as necessidades específicas. Sueli Carneiro escreveu sobre isso em: Enegrecer o Feminismo: a situação da mulher negra na América Latina a partir de uma perspectiva de gênero (.pdf). Nós, mulheres negras, além de sermos vistas como indesejadas, também somos vistas como se fossemos todas iguais. Vicenta Camusso, representante da Rede de Mulheres Afro-latinoamericanas, caribenhas e da Diáspora do Uruguai, explicou de forma brilhante no II Seminário da Mulher Afro Latinoamericana e Caribenha de 2011, realizado pela prefeitura de São Paulo: “Não somos iguais, tampouco somos diferentes. Somos diversas e distintas. Somos múltiplas”.

Foto de Carla da Silva/Blog Excertos – Educação e Cultura/Fundação Cultural Palmares.

Os índices mostram que as mulheres negras tem os piores empregos e os piores salários, mas quando uma feminista escreve sobre isso, ela escreve apenas “ mulheres” e usa uma fotografia de uma mulher branca. Nós, mulheres pretas, sabemos que somos entendidas como “outras” mulheres, as específicas. Somos realmente diferentes, temos outras histórias e outras lutas, mas esta relação que ora quer incluir a mulher negra como igual e a apaga completamente nas representações, ora tem interesse festivo por suas demandas nos confunde.

Estão matando mulheres pretas. A morte mais recente foi de Zulmira. Onde estavam as feministas para protestar por esta morte? Houveram manifestações nas ruas de são Paulo realizada pelos movimentos sociais negros, angolanos e imigrantes, mas onde estavam as feministas? Campanhas racistas, em comerciais de TV como a propaganda da BOMBRIL, DOVE e tantas outras. Novamente, onde estavam as feministas?

Quer dizer, nós mulheres pretas não queremos pedir ou aguardar inclusão nos espaços de lutas feministas, mas sim continuar lutando, unindo e resistindo do nosso jeito. Nossas diferentes raízes históricas dizem sobre quem somos e dizem abertamente sobre como devemos fazer. Mas nós queremos o apoio das feministas não-negras em nossas lutas. Queremos realmente acreditar que quando uma mulher preta é assassinada, todas as mulheres irão se indignar. Queremos confiar que nossas antepassadas não serão fetiche intelectual pós-moderno. E principalmente, queremos construir acreditando que aquilo que nos separa não é mais forte do que os laços que nos unem.

* Aline Dias é negra, lésbica e historiadora ainda sem diploma. Não gosta de groselha, discute com a TV e conversa dormindo.