A violência sexual contra as mulheres no Egito

Declaração do movimento egípcio The Baheya Ya Masr. Tradução de Iara Paiva.

Original publicado em inglês na página do The Baheya Ya Masr no facebook

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Declaração Importante

A Violência Sexual Contra as Mulheres no Egito

Violência e Tortura sexuais contra mulheres não impedirão sua luta para atingir os objetivos da Revolução.

Na tentativa de parar a contínua luta das mulheres egípcias para atingir os objetivos da Revolução de Janeiro – Dignidade, Liberdade e Justiça Social – grupos organizados  começaram a usar a violência sexual como arma, variando da obscenidade e assédio sexual ao estupro, estupro em massa,  mutilação sexual e tentaivas de homicídio contra as mulheres.

Há muito tempo o corpo das mulheres é abusado em guerras e conflitos armados para promover a guerra psicológica com a intenção de humilhar o inimigo e destruir sua moral. Pesquisas acadêmicas e as Nações Unidas revelaram que centenas de milhares de vítimas sofreram violência e tortura sexuais durante a Segunda Guerra Mundial. Mais recentemente, centenas de crimes sexuais foram descobertos em Ruanda, Sérvia, Bósnia, Darfur, Iraque, Líbia e Síria.

Mulher lidera puxa gritos de protesto na Praça Tahir em 6 de fevereiro de 2011. Foto de Joseph Hill no Flivk em CC, alguns direitos reservados.
Mulher puxa gritos de protesto na Praça Tahir em 6 de fevereiro de 2011. Foto de Joseph Hill no Flickr em CC, alguns direitos reservados.

Os responsáveis ​​por estes atos abomináveis ​​esperam que o estigma social impeça as mulheres de falar publicamente. Eles contam com a cumplicidade das agências de aplicação da lei em não cumprir o seu papel de proteger os manifestantes. Eles acreditam que muitos políticos vão permanecer em silêncio para proteger a “reputação da Praça Tahrir” e que as forças políticas que vêem as mulheres somente como nudez (Awra) vão fazer vistas grossas porque essas ocorrências só reforçam seus ponto de vista negativo sobre as mulheres.

Mas as mulheres do Egito decidiram falar! Decidiram fazer todas as partes envolvidas encararem sua responsabilidade em combater estes atos humilhantes de opressão. Esses atos não são somente dirigidos contra as mulheres. Eles visam quebrar a vontade da nação egípcia como um todo. A nação egípcia cujas manifestações em massa antes da queda de Mubarak foram caracterizadas pelo respeito às mulheres. Nenhum incidente de assédio sexual em massa ocorreu durante os dias da Revolução.

A onda agressões sexuais em massa contra as mulheres não parou desde que o regime de Mubarak começou a usar a violência sexual contra manifestantes em maio 2000. Além dos assédios sexuais de massa que ocorrem em locais públicos e lotado durante feriados religiosos, o Egito presenciou ataques a ativistas de direitos das mulheres comemorando o Dia Internacional da Mulher, em 8 de março de 2011. Apenas um dia depois, mulheres participando de uma ocupação na Praça Tahrir foram detidas e submetidas a testes de virgindade forçados na prisão militar.  Depois que os muçulmanos tomaram o controle do Parlamento, as mulheres foram crescentemente colocadas como alvo.  Ataques brutais contra elas, muitos nos quais as vítimas foram espancadas com cintos, ocorreram dentro e ao redor da Praça Tahrir, em junho e julho de 2012. Estas investidas aumentaram e se transformaram em agressões contra as mulheres, ataques e ameaças sexuais com o uso de armas brancas durante as comemorações da Revolução este ano. Foram inclusive documentados casos de vítimas esfaqueadas.

Numerosas sobreviventes dessas agressões deixam claro que esses ataques foram perpetrados por grupos altamente organizados, cuja aparência geral não indica que estejam entre os arruaceiros que assediam sexualmente as mulheres aleatoriamente, mas são na verdade bem organizados e especialmente preparados para a sua missão. Um exemplo disso ocorreu em 25 de janeiro. Um grande número milicianos cercou mulheres que marchavam na Praça Talaat Harb, formando um cordão em torno delas. O cordão gradualmente fechou-se, até que foram separadas dos clérigos Azhar que também participaram do protesto. Quando a marcha chegou à entrada da Praça Tahrir, os milicianos se dividiram em grupos menores, cada um cercando uma mulher e levando-a a uma parte remota da praça. Ali cada mulher teve seu corpo molestado por dezenas de mãos.  Algumas das vítimas foram ameaçadas pelo uso de armas brancas. Outras foram submetidas ainda à mais violência física.

Comício na Praça Tahir em dezembro de 2011 para exigir que a Suprema Corte Militar transfira seus poderes para um governo civil. Foto de Lorenz Khazaleh no flickr em CC, alguns direitos reservados.
Comício na Praça Tahir em dezembro de 2011 para exigir que a Suprema Corte Militar transfira seus poderes para um governo civil. Foto de Lorenz Khazaleh no flickr em CC, alguns direitos reservados.

O regime de Mubarak começou a usar a violência sexual contra mulheres manifestantes em maio 2005. Hoje, o regime político vigente está tentando usar a mesma arma. Mas está, no entanto, superando o regime anterior, usando grupos organizados e treinados para executar esses atos abomináveis. Da mesma maneira como expusemos o regime de Mubarak e o combatemos nacional e internacionalmente, vamos lutar contra o atual regime e as instituições que são responsáveis ​​ou cúmplices nestes crimes, e vamos também processá-los legalmente nacional e internacionalmente. Mas, o mais importante é que não vamos interromper nossa luta pela realização das demandas da Revolução Egípcia e a luta pela plena igualdade entre os cidadãos desta nação e contra a discriminação com base em sexo, religião, ideologia, classe ou origem geográfica ou quaisquer outras formas de discriminação.

Signatários

– Organizações:

El-Nadim Centro de Reabilitação de Vítimas de Violência

Fundação Nova Mulher

Fórum A Mulher e memória

Baheya Ya Masr

CEWLA

Seta de Confiança

União das Mulheres do Egito

Voz das Mulheres egípcias

Mulheres egípcias para a Mudança

Egípcios contra a discriminação religiosa

Ação Egito

Associação de Desenvolvimento Nacional Egípcio

Conselho de consultoria para Associações Coptas

Associação para a Liberdade de Pensamento e de Expressão

Filhas da Terra

União Egípcia da Mulher

Bashaier para o Desenvolvimento da Sociedade

A Aliança para Mulheres Árabes

Parlamento da Mulher

Shoft Ta7rosh

One World Fundação para o Desenvolvimento e Cuidado da Sociedade Civil

Vigília Fouada

Tawafok Centro de Assistência Jurídica e Desenvolvimento

Sociedade para a Melhoria da Saúde no Cairo

Cairo Centro de Desenvolvimento e Direitos Humanos

Egípcios Contra a Discriminação Religiosa

Roueya para o Desenvolvimento e Estudos de Mídia

Socialistas Revolucionários

Academia Egípcia Democrática

Instituição Egípcia Democrática

Fundação Tarifas

Fundação para o Desenvolvimento da Família Egípcia

Iniciativa Egípcia para Mulheres Advogadas

União Nacional para a Independência dos Advogados

Egito Iluminado

Movimentos de Jovens e de Iniciativas

Frente Egípcia de Criatividade

Movimento Positivo

Juventude para a Justiça e Liberdade

Socialistas Revolucionários

Juventude Lotus

Os Egípcios Livres

Unidade Nacional da Juventude

A Egípcia Livre

– Partidos Políticos:

Partido Social Democrata Egípcio

Partido da Aliança Popular Socialista

Corrente Popular Egípcia

Partido Al Dostour

Partido Masr Alhorreya

Al Masreyeen Al Ahrrar

Partido Egípcio Socialista

– Indivíduos:

Abdel Galil Moustafa, Abdel Rahman Hamdy, Abir Solaiman, Ahmed Hassan Mahmoud, Ahmed Hussien Abdel Wahab, Ahmed Mamdouh Taweel, Aida Nour El Din, Aly Abdel Tawab Ahmed, Amal Abdel Hady, Amal Awad, Amal Bahgat, Amany El Mofti, Amer Bakr Abdallah, Amira Hussein, Amr Qennawy, Anam Morad, Anisa Essam Hassouna, Arwa Balbae, Ashraf el Bahrawy, Ashraf Samir Gherbal, Azza Balbae, Azza El Sawy, Azza Kamel, Azza Khalil, Azza Saleh, Azza Soleiman, Basem Samir Awad, Botheina El Said, Botheina Kamel, Dai Rahmy, Dalia El Aswad, Ebtesam Hassan Zahran, Emmad Abu Ghazy, Enaam Morad, Entisar Said, Essam Shiha, Fadya Moghith, Farah Shash, Faten Mohammed Aly, Fathy Farid, Fatma Khafagy, Inas Mekkawy, Fatma Ramadan, Gawaher El Taher, George Ishaq, Habiba Ibrahim, Hala Abdel Qader, Hala Khalil, Halah Kamel, Hanan Darwish, Hanna Farid, Hannah Abul Ghar, Hannan Mamdouh, Hanya el Shalaqamy, Heba Badr, Heba Solaiman, Hebba Adel, Hebba Mostafa, Hemmat Abd Rabboh, Hoda el Sadda, Hossam Issa, Hossam Mo2nes, Ibtesam Taelab, Ibtisam Amr, Iman Ashour, Iman Darwish, Iman Hijjazy, Inas Soliman, Intesar Said, Ismail Selim, Jalila el Qady, Janet Abdel Alim, Jawaher el Taher, Jihan Abu Zeid, Jihan Abuzeid, Karima El Hefnawy, Khaled Yousef, Laila Amiry, Leila Atteya, Lobna Essam, Loubna Khater, Lymae Lotfy, Maether Qandil, Magda Tadros, Maget Michel, Magi Abdel Fattah, Maha El Gazzar Hussein, Maha Mekkawy, Maha Yousef, Majda Adly, Majda Micheal, Manal Bahgat, Manal El Beily, Manal Fathy Mahmoud, Manar Ibrahim, Marwa Abdel Rahman, Marwa El Sawy, Marwa El Seedy, Mary Adel, Mawaheb El Molyhy, May El Shalaqamy, May Mansour, Micheal Fares, Micheal Raof, Micheal Rezk Allah, Michel Rezkallah, Mohammed Abdel Azziz, Mohammed Monir Mojahed, Mona Abul Ghar, Mona Asad, Mona Ezzat, Mona Hamed, Mona Mina, Mona Monir, Mona Saad, Mona Zhufoqqar, Mostafa Riad, Nadya Abdel Wahhab, Nahed Issa, Nahed Marzouk, Nahla Bakr, Nahla El Sedany, Nahla Ibrahim, Nasry Gerges, Nazly Shaheen, Neveen Ebeid, Nihal Ahmed Hattata, Nihal Nasrallah, Nola Darwish, Nour El Hoda Zakky, Olfat Abd Rabboh, Raghda Sleit, Ragya el Garazawy, Ragya Omran, Ramez Aref, Rawya Abdel Rahman, Rimone Edward, Rober Fares, Sahar Said, Sahar Talaat, Salah El Amrosy, Salma Najy, Salma Shams, Salwa el Antary, Samira El Gazzar, Samya Adly, Samya Ramadan, Sanaa Fouad, Sawsan Samy, Sawsay Noweir, Shadia Mohammed Adly, Shahar El Said, Shahida Moqalled, Sherif Hatata, Sherin Farouk, Shoqeya el Kordy, Soad Sobhy, Taghrid Micheal, Taher Abulnasr, Terese Smair, Tork Yousef, Wahid Abdel Majid, Yousef Zidan, Zeinab Kheir.

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Nota da tradutora

No dia 5 de fevereiro, uma amiga compartilhou comigo uma foto com esta declaração do movimento egípcio The Baheya Ya Masr. A declaração me impressionou não tanto pelo conteúdo das denúncias apresentadas (sabemos que o uso de violência sexual como arma de repressão política é infelizmente comum, como atesta nossa própria história), mas pelo o número de entidades civis e partidos políticos que a subscreve. Nós sabemos muito pouco sobre a participação política das mulheres egípcias, logo vi na tradução deste manifesto uma oportunidade para apoiar sua luta e diminuir a nossa ignorância sobre o que acontece em seu país.