Texto coletivo do FemMaterna.
Diante da ameaça de aprovação do Estatuto do Nascituro pelo Poder Legislativo, como tem sido amplamente divulgado, discutido e combatido (inclusive aqui e aqui), nós do FemMaterna gostaríamos de contar a história de algumas mulheres (omitiremos seus nomes reais).
História 1 – T., 29 anos, sofreu um aborto espontâneo no banheiro de casa, antes sequer de saber que estava grávida. Socorrida pela polícia, ficou algemada ao leito do hospital, e depois de ter alta, foi levada diretamente à delegacia. Embora precisasse de cuidados médicos, foi obrigada a dormir no chão por causa das condições degradantes da prisão a que foi levada. Era ela quem sustentava a sogra e o filho. T. foi condenada a 40 anos de prisão.
História 2 – R., 30 anos, e seu marido receberam a notícia da gravidez com muita alegria, pois era planejada e desejada. Entretanto, um ultrassom feito na oitava semana mostrou que o feto não tinha batimento cardíaco e não tinha se desenvolvido. Além da tristeza imensa, começou a angústia, porque R. estava com aborto retido. Os sintomas de gravidez – sonolência, cansaço – continuam, pois tecnicamente R. continua grávida. Mas embora esteja carregando um feto inviável e corra o risco de uma infecção generalizada caso o aborto espontâneo não ocorra, a lei impede que R. realize qualquer procedimento.

História 3 – Em uma de suas primeiras experiências sexuais, C. descobriu, aos 17 anos, que estava grávida do namorado. Ela conversou com a mãe e juntas decidiram pelo aborto. A tia de C. conseguiu o remédio e o aborto foi feito escondido. Tudo correu bem, exceto que C. foi denunciada à polícia por uma vizinha que desconfiou da história. Submetida a um inquérito policial e médico, C., sua mãe e tia foram condenadas e cumprem pena.
História 4 – A., de 9 anos, está grávida de gêmeos, como resultado de estupros recorrentes cometidos por seu padrasto, que foi preso e confessou que também cometia violência sexual contra a irmã de A., de 14 anos, que sofre de transtornos mentais. A. corre risco de vida caso a gravidez não seja interrompida. Apesar do empenho jurídico de entidades feministas, a igreja católica pressiona a justiça para que cumpra a lei, que não permite o aborto em hipótese alguma.
História 5 – F. descobriu que estava grávida do segundo filho e toda a família ficou muito feliz. Mas já os primeiros exames revelaram que se tratava de uma gravidez ectópica. Numa corrida contra o tempo, a família e os médicos tentaram obter na justiça a autorização para o procedimento cirúrgico que salvaria a vida de F. A solução do caso, recusada repetidas vezes pelos tribunais, chegou ao conhecimento da mídia e uma multidão de manifestantes Pró-Vida permaneceu na frente do hospital protestando contra a interrupção da gravidez. Depois de vários dias, F. veio a falecer. Atualmente seu marido cuida sozinho da filha do casal, de 4 anos.
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Todas as gestações dessas histórias são reais e a maioria de nós conhece uma mulher que já esteve em uma situação como essa. Mas algumas dessas histórias tiveram seu final modificado para refletir alguns desfechos possíveis caso o Estatuto do Nascituro no Brasil seja aprovado e entre em vigor.
História 1 – História real. Maria Teresa Rivera, de El Salvador. Veja a história completa aqui.
História 2 – A história é real, mas o desfecho acima é fictício. O verdadeiro desfecho é este: Depois de um mês sem que seu organismo expelisse naturalmente o feto inviável, R. submeteu-se a uma curetagem. Apesar de estar saudável e fisicamente pronta para engravidar novamente, R. sofreu muito a perda da gravidez e teme tentar novamente.
História 3 – A história é real, mas o desfecho acima é fictício. O verdadeiro desfecho é este: C. sofreu muito com o aborto, mas nunca se arrependeu pela decisão. Hoje C. está formada, é casada e está planejando engravidar em breve.
História 4 – A história é real, mas o desfecho acima é fictício. O verdadeiro desfecho é este: O caso aconteceu em 2009 no município de Alagoinha, PE. A. obteve na justiça autorização para interromper a gravidez e o procedimento foi realizado. O arcebispo de Recife e Olinda, dom José Cardoso Sobrinho, decidiu excomungar a mãe da menina e os médicos responsáveis pelo procedimento. Veja a história completa aqui.
História 5 – A história é real, mas o desfecho acima é fictício. O verdadeiro desfecho é este: F. submeteu-se a uma cirurgia de emergência. Sofreu bastante pelo fato de a gravidez ter tido um desfecho adverso e por sentir muita falta da filha nos dias em que passou no hospital. F. recuperou-se sem sequelas.
Nós do FemMaterna nos somamos a todas as vozes contrárias à aprovação do Estatuto Nascituro, em qualquer versão, tanto a original quanto as substitutivas, pois imaginamos que a aprovação de qualquer versão trará um cenário de horror, violência e agressão à vida de nossas irmãs, filhas, amigas, conhecidas e desconhecidas. Diga não ao estatuto votando aqui.