Todo homem?

Texto de Sara Joker.

É sempre bom voltar a escrever por aqui, sinto falta. O último ano foi, no mínimo atribulado e corrido. Iniciei uma segunda graduação, fui morar sozinha, comecei num novo emprego. Minha vida deu uma guinada e, de repente, tudo havia mudado!

Trabalho com inúmeras pessoas, convivo todos os dias com gente de todos os tipos, tanto colegas de trabalho quanto clientes e, ouço muitos clichês sobre a vida de um casal heterossexual e monogâmico. Pessoas se acostumaram a generalizar a vida amorosa e sexual das outras. Comecei a notar que existem “coisas que todo homem faz”, “coisas que toda mulher faz” e “coisas que todo casal faz”.

E, na minha opinião, o pior clichê é a afirmação que todo homem trai. A primeira certeza dessa afirmação que me irrita é reduzir um relacionamento heterossexual a duas pessoas. Exclusividade é uma escolha. E, deve ser feita entre todas as pessoas envolvidas num relacionamento. O que é ou será enxergado como traição diz respeito apenas a quem faz parte desse relacionamento.

Mas, vamos supor que nesse relacionamento heterossexual, os dois desejam exclusividade. Por que, então, supor que existe ou poderá existir traição? Ah, uma dessas pessoas pode decidir não ser exclusiva mas, não deseja que a pessoa ao seu lado deixe de ser. Minha dúvida é: só os homens traem? Claro que não. Outra dúvida: por que tantas mulheres acreditam que TODO homem trai? Não consigo e não gosto de generalizar ninguém. Não acredito que infidelidade venha do cromossomo Y e, por isso, é da “natureza do homem”.

Marcha das Vadias Rio de Janeiro, 2012. Foto de Thercles Silva no Facebook.
Marcha das Vadias Rio de Janeiro, 2012. Foto de Thercles Silva no Facebook.

Já ouvi que sou ingênua em confiar, mas para viver a dois, eu preciso confiar. Não na fidelidade, mas sim na amizade e no companheirismo. Acima de tudo, preciso confiar que convivo com uma pessoa e não com um  animal irracional que “pensa com seus órgãos genitais e hormônios”. Ser homem não é “comer geral”, não ter o mínimo de companheirismo ou não respeitar mulheres como indivíduos complexos, com sentimentos e vontades.

Quero deixar claro que meu objetivo com esse texto não é fazer uma defesa da monogamia. Não defendo que tenhamos apenas uma pessoa toda a vida. Defendo que ninguém repita comportamentos clichês para “ser homem”.

Fico ofendida quando ouço qualquer afirmação generalizada sobre homens, mulheres, pessoas brancas, negras ou qualquer grupo. Não existem caixinhas onde colocamos as pessoas de acordo com gênero, raça, cor, orientação sexual ou qualquer coisa. Então, não é porque é homem que trai (ou melhor, mente para se envolver com outras pessoas). Não é da natureza do homem ter várias mulheres ou não resistir a um rabo de saia, como dizem por aí. Quando justificamos a traição, chegamos a praticamente justificar o estupro: “Ele é homem, não resistiu, a carne é fraca”.

Esse comportamento é uma construção social, assim como menina usar rosa e menino usar azul. Não nasce com o menino essa falta de controle. A criança é educada a olhar mulheres na televisão e chamá-las de gostosa. Ouve, desde pequeno que, quando crescer vai dar trabalho. A sociedade ensina, se não é em família que se aprende, aprende na rua, entre amigos. É uma luta diária criar meninos e meninas sem machismo.

Esse é um comportamento que pode ser mudado educando homens e meninos heterossexuais, mostrando que não existe nenhum precedente que faça deles mais ou menos homem. Que nenhuma ação é “mais aceitável” por eles serem homens. Todos nós somos seres falíveis, podemos agir de uma forma que desrespeita o que combinamos com outra pessoa. Mas, as justificativas podem ser muitas, menos: “ser homem”.