Violência na Marcha das Vadias de São Paulo

Relato de Carol Patrocínio. Publicado originalmente em sua página no Facebook no dia 24/05/2014.

Vídeo com cenas da violência contra as mulheres na Marcha das Vadias de São Paulo.

O privilégio do opressor foi jogado na nossa cara durante a Marcha das Vadias. Foram, pelo menos, 500 mulheres encarando chuva para luta por seus direitos. Caminhamos pela Paulista e descemos a Augusta.

Quando estávamos perto do número 541, a Marcha se separou e uma menina foi agredida. O agressor correu para dentro de uma academia e foi acolhido. A história só foi compartilhada quando já estávamos na Praça Roosevelt.

Depois de encerrada a Marcha, um grupo de 150 pessoas subiu para a academia. A intenção era fazer um escracho. Chegamos lá e fomos recebidas com um sorriso irônico tanto do agressor quanto do dono da academia. Começou um empurra-empurra, uma menina foi agredida, o namorado tentou defende-la e se tornou o foco da polícia.

As mulheres da Marcha, em sua maioria, tentaram separar, mas sem sucesso. A polícia nos empurrou, agrediu e continuou batendo em um dos nossos. Enquanto isso, do outro lado, o agressor ria na cara de quem dizia que ele estava errado. Uma garota perguntou se ele também bateria nela — enquanto eu pedia para que ele voltasse para dentro da academia e evitasse uma tragédia — e ele apenas sorriu pra ela o sorriso mais assustador que já vi.

Rolou bomba, rolou gás. Muita gente correndo, passando mal. Muitas mulheres extremamente nervosas com mais um desrespeito sofrido. Um dos nossos foi algemado — isso não é inconstitucional? — e levado para dentro da academia junto com algumas mulheres. A porta foi baixada, ninguém sabia o que estava acontecendo.

Começamos a ser informados pelas mulheres que estavam ali. Estava tudo bem, mas ele continuava algemado e o agressor numa boa. Chegou uma advogada e todo mundo ia para a Delegacia de Polícia. O Choque estava lá. A polícia fez um cordão para que as pessoas pudessem sair. O homem que estava conosco saiu algemado e foi jogado em um porta-malas. O agressor e o homem que o acolheu entraram no banco de trás numa boa.

Quando o agressor e o dono da academia saíram, eles olharam na cara de cada uma de nós, sorriram. Eles não estavam preocupados com o que ia acontecer. Eles sabem que a polícia estava ali para proteger o status quo, que estão no topo da cadeia alimentar. A nós, impotentes, restou seguir para a DP, prestar depoimentos, entregar fotos e vídeos que comprovavam todas as agressões e abusos.

No meio de uma Marcha por igualdade e respeito tivemos jogado na nossa cara todos os privilégios do opressor e sua certeza de impunidade. Tivemos, durante essa Marcha das Vadias, a certeza de que o feminismo é extremamente necessário e que, se depender de nós, machistas não passarão. Mexeu com uma, mexeu com todas.

Manifestantes se concentram no vão livre do Masp para a 4° Marcha das Vadias de São Paulo, com o lema "Quem cala não consente!". Foto de Nelson Antoine/Fotoarena/Estadão.
Manifestantes se concentram no vão livre do Masp para a 4° Marcha das Vadias de São Paulo, com o lema “Quem cala não consente!”. Foto de Nelson Antoine/Fotoarena/Estadão.