O desrespeito a identidade de gênero no jornalismo brasileiro

Texto de Talita Barbosa para as Blogueiras Feministas.

Há alguns meses, tenho observado notícias em grandes portais sobre mulheres e homens trans desrespeitando suas identidades de gênero. Referem-se às mulheres trans como homem e as chamam pelo pronome masculino “ele”, da mesma forma, os homens trans têm a sua identidade desrespeitada quando os chamam pelo pronome “ela”. Isso é reflexo da transfobia, o preconceito e discriminação com pessoas trans é pouco debatido na sociedade, especialmente dentro do jornalismo.

Há inúmeros casos que podem ser observados. Meses atrás, após a divulgação da foto da travesti Verônica Bolina desfigurada e nua, vários telejornais e sites fizeram questão de expor o seu nome de registro e usar o pronome “ele” ao invés do “ela”. Caso recente é o assassinato da travesti Laura Vermont de apenas 18 anos, que os jornalistas, mais uma vez, se referiram a ela como ele. Pois, nem depois de morta a sua identidade de gênero merece ser respeitada, não é? Infelizmente, a maioria das notícias que envolvem pessoas trans está relacionada a violência, pois o Brasil é o pais que lidera o número de mortes de travestis e transexuais, de acordo com relatório da ONG internacional Transgender Europe. Portanto, nem mesmo na notícia de sua morte as pessoas trans tem sua identidade, imagem e privacidade respeitadas.

Não sei se a graduação destes jornalistas tem ênfase em desrespeito a identidade de gênero alheia, mas com certeza eles têm obtido êxito neste quesito. Apesar de não existir uma disciplina específica que trate de gênero e sexualidade numa graduação em jornalismo, acredito que deva ser obrigação do profissional da área de comunicação entender e procurar respeitar às necessidades dos diversos grupos que existem dentro da sigla LGBT, quando lhe for encaminhada uma pauta sobre o tema.

Há o problema das escolhas e posicionamentos políticos do veículo de comunicação, que muitas vezes prefere incorrer em preconceito e transfobia por acreditar que assim será mais fácil informar seus leitores. Ora, não é preciso saber teoria acadêmica sobre gênero para respeitar o uso de pronomes que a própria pessoa usa para se identificar. Por mais que para muitas pessoas a questão trans seja difícil de ser compreendida, se não mudarmos a maneira como a comunicação é feita, os leitores dos jornais também não serão informados de que maneira essas pessoas preferem ser identificadas.

Protesto contra a transfobia realizado num shopping em São Paulo. Janeiro/2014. Foto de Cris Faga/Fox Press Photo/ Estadão Conteúdo.
Protesto contra a transfobia realizado num shopping em São Paulo. Janeiro/2014. Foto de Cris Faga/Fox Press Photo/ Estadão Conteúdo.

É importante saber que a sigla LGBT significa: Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros. Logo, o grupo LGBT não se resume apenas aos gays cisgêneros (que se identificam com o gênero que lhes é designado no nascimento). Lésbicas são mulheres – cisgêneras ou trans – homossexuais. Bissexuais não são pessoas indecisas, mas pessoas cuja sexualidade não se restringe a um único gênero. Por fim, existem pessoas trans, que não se identificam com o gênero que lhes foi designado ao nascer e que devem ser tratadas de acordo com o gênero que se identificam.

Se houver dúvidas, pergunte a pessoa como ela prefere ser tratada. Se não tiver como fazer isso, pesquise para saber como ela é tratada por conhecidos, como se identificava em redes sociais ou como foi tratada por veículos de mídia que tem preocupação em não reproduzir preconceitos. Mais uma vez, não é preciso ter estudado tudo sobre gênero para incluir em sua prática cotidiana algo que é básico: respeito.

Respeitar a identidade de gênero, enquanto profissional do jornalismo, é entender o Artigo XIV do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros e fazê-lo valer na prática. Pois, o jornalista não pode “concordar com a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais, políticos, religiosos, raciais, de sexo e de orientação sexual”.

Para ajudar, há ferramentas que podem ser acessadas pela internet como o: Guia Técnico sobre pessoas transexuais, travestis e demais transgêneros, para formadores de opinião de Jaqueline Gomes de Jesus.

Autora

Talita Barbosa é mulher feminista, negra, baiana e estudante de Jornalismo.

+ Sobre o assunto: Como a imprensa brasileira trata o movimento LGBT.