Como Nossos Pais: um filme feminino que quer ser feminista

Texto de Bia Cardoso para as Blogueiras Feministas.

Atenção! Esse texto contém spoilers!

Na maioria das críticas que li sobre o filme Como Nossos Pais, o feminismo foi pontuado: “anseios e conflitos da mulher neste século”; “os dilemas da supermulher”. Então, começo dizendo que não classifico como um filme feminista, mas isso não é importante. O bom de Como Nossos Pais é que ele é um filme feito por mulheres e onde elas são a história principal. Tudo gira num núcleo familiar, onde sabemos que decisões e ações não são fáceis de serem tomadas.

Ao avaliar o filme por um viés feminista, classifico-o como branco e burguês. Rosa (Maria Ribeiro) vive dramas de uma mulher branca de classe média, alguém que não parece ganhar muito bem, mas tem móveis assinados incríveis na sala. É difícil achar uma pessoa negra no filme, é difícil encontrar diversidade. Mas, dentro de todos os clichês, Rosa poderia ser eu ou uma de minhas amigas. Uma mulher entre 35 – 45 anos que lida com um marido esquerdomacho, uma mãe egoísta, um amante feministo. O filme acaba sendo divertido justamente por condensar tão bem tantos clichês do feminismo da internet atual.

Rosa é a personagem principal. Jornalista, casada, mãe de duas filhas. Deixou de lado sonhos profissionais para ter um emprego capitalista e cuidar da família. Tem constantes embates com a mãe. Tem um marido ausente, um irmão ausente, um pai ausente. É responsável por tudo e todos. Cansei só de relembrar como Rosa é sozinha, ela não tem nem mesmo uma melhor amiga. Nesse ponto, Rosa não parece uma heroína, mas sim uma mártir.

Minha empatia com Rosa demorou, foi se desenvolvendo porque a mãe e o marido me deixaram com raiva. Mas, na verdade, eu estava com raiva de Rosa que parecia não saber enfrentá-los.

Dado (Paulo Vilhena), o marido, é a melhor personificação de esquerdomacho que já vi. Antropólogo, luta bravamente pela Amazônia e por isso vive ausente, é festejado por familiares e amigos por seu heroísmo, mas não participa da rotina de casa e das filhas. E claro, reclama da falta de sexo no casamento.

Minha cena favorita de todo filme acontece no banheiro do casal, um desses banheiros chiques com duas pias. Rosa acaba de ser demitida após um erro grave, fala de suas frustrações e do sonho que abandonou de ser dramaturga, em seguida tem que ouvir do marido que ele também desistiu de muitas coisas para fazer o que faz, entre essas coisas a principal é o futebol com os amigos. Quantas vezes não conhecemos homens tão sofredores assim, não é mesmo?

Clarice (Clarisse Abujamra), a mãe, é uma dessas personagens que adoramos amar. Fala verdades, sabe muito bem o que quer, sempre lacradora com seu cigarro. Uma mulher com quem Rosa não consegue competir e ao mesmo tempo um ideal de mulher que não consegue abandonar. É Clarice quem dá o start na transformação de Rosa, mas não temos um fim em si.

Como Nossos Pais dialoga com Casa de Bonecas (1879), peça teatral de Henrik Ibsen, que falava da exclusão das mulheres na sociedade burguesa. A peça que Rosa escreve é sobre o que aconteceu com Nora após ir embora. Fazendo um paralelo didático, o filme questiona: o que acontece com as princesas disney depois do final feliz?

Fiquei um pouco frustrada porque em nenhum momento Rosa tem sua catarse. Ela não se rebela totalmente. Como feminista, tenho anseio por revoluções, mas não é esse o objetivo do filme. A proposta é a intimidade, sua naturalidade, seu cotidiano, um primeiro passo para pensar a vida de outras maneiras. É um filme feito por e para mulheres que estão em busca de si mesmas, que estão descobrindo que o feminismo não significa odiar homens, que estão perdendo o medo de se dizerem feministas.

Créditos da imagem: Cena do filme Como Nossos Pais (2017).