Naturalização dos papéis sociais é algo tratado cotidianamente aqui pelo Blogueiras Feministas. Também é notório o fato de que normalmente quer manter o status quo da sociedade acaba por defender a naturalização dos papéis sociais, seja de homens e mulheres, negros e brancos, LGBTs e heterossexuais e tantas outras categorias em que os seres humanos se encaixam.
Porém tem momentos em que nos deparamos com comentários que deveriam sumir da face da terra, por seu total desconhecimento da realidade histórica, social e política do nosso país. O grande exemplo de pessoas assim é o jornalista do SBT Santa Catarina (antes jornalista da RBS) Luiz Carlos Prates, não seria de se indignar de ver tão reacionária pessoa defender a família heteronormativa como detentora dos valores morais e dos bons costumes. Até por que ele publicamente defende a ditadura militar e a TFP, não seria estranho nenhum pouco ele relacionar pudor a famílias heteronormativas, né?
No último dia 31 de maio a incoerência retórica do Luiz Carlos Prates e seu machismo foi de uma desinformação só, como de costume, mas que não deve ser ignorada.
Há pouco tempo foi publicado na imprensa que a atriz Ana Karolina é criada por dois homens, desmistificando parte do comentário altamente preconceituso de Prates, porém não é isso que mais me incomoda no comentário.
Há neste comentário uma culpabilização infundada da emancipação da mulher destas últimas décadas, ou seja, Prates culpa as mulheres pelo fato de ter havido o “fim” da tradicional família brasileira e da mulher não cumprir mais cotidianamente as tarefas a qual “naturalmente” foi designada de terem falido a educação pública no país. A conta dele é bem clara: pai disciplinador+mãe doce+professora vocacionada=educação pública de qualidade, como se o investimento público na educação não fosse necessário ou o próprio processo de desmantelamento deste serviço por parte da ditadura militar (óbvio que ele não falaria isso, em outros comentários já celebrou época tão fúnebre da nossa história).
Contrário ao seu discurso de valorização da educação, o regime militar concentrou as suas ações na repressão violenta a professores e estudantes que se colocaram contrários ao regime vigente, controlaram política e ideologicamente o ensino com vistas a eliminar o exercício da crítica social e política. Do ponto de vista teórico, o Regime Militar orientou a política educacional com bases na economia da educação de cunho liberal, ou seja, o Regime Militar seguiu as orientações contidas na teoria do capital humano (Becker e Schultz), com o objetivo de estabelecer uma relação direta, imediata e mesmo subordinada da educação à produção. (SANTOS, Flávio Reis. Ditadura Civil-Militar e educação no Brasil)

Em um momento onde mais de 50 universidades brasileiras estão em greve geral, onde estados se mobilizaram no começo do ano pelo piso nacional da categoria dos docentes em diversos estados, quando em São Paulo a greve dos professores municipais foi duramente reprimida pelo governo Kassab e traída pelo seu sindicato é uma lástima ver este senhor se dignando a falar de educação pública em nosso país. Setor muitas vezes hegemonizado por mulheres, pois faz parte do dito trabalho de cuidados e que são deveras precarizadas.
Não, primeiro que não acho algo natural haver pobres e ricos como este reacionário diz, segundo acho um ataque brutal a todos os debates para desconstruir a família nuclear heteronormativa e burguesa e terceiro por responsabilizar mulheres que dão duro dia após dia nas salas de aula, ganham mal, cumprem dupla ou tripla jornada de trabalho pela falência da educação pública no Brasil. O Estado serve para que então? A falta de investimento no setor, que motiva há anos a pauta do 10% do PIB para educação pública, é responsabilidade de quem? Da economia doméstica que não!