As Perseguidas e outros blocos de carnaval feministas

Texto de Jul Pagul e Srta. Bia.

ô abre alas, que eu quero passar

eu sou da luta, não posso negar*

Tem quem não goste, mas estamos no time das que adoram a folia carnavalesca. É um período de muita festa, reunir os amigos, visitar aquela pessoa especial, marcar aquele almoço que foi sendo adiando indefinidamente, colocar a casa em ordem, brincar com a criançada e sair às ruas. Porque carnaval é com o bloco na rua, com as pessoas ocupando os espaços públicos, reivindicando a cidade para si. Acreditamos que o carnaval é um evento de retomada e principalmente de caos, onde os gritos, os pulos, a farra tem sua catarse coletiva.

Esse ano, as feministas e transviadas de Brasília foram atacadas por meio de panfletos apócrifos espalhados por uma rua em que tradicionalmente acontecem vários eventos feministas. Estamos incomodando o machismo, a lesbofobia, a transfobia, a homofobia, o patriarcado. Há mulheres guerreiras sendo perseguidas porque exigem ter voz onde deveriam apenas servir o cafezinho ou balançar os cabelos charmosamente. Há ameaças diárias, em vários espaços da cidade por onde o movimento LGBT ousou hastear bandeira. Porém, somos fortes.

Em plena folia do carnaval 2013 decidimos romper o silêncio! O Bloco das Perseguidas é uma vadiação livre, que pretende unir a luta feminista à maior folia do planeta com muito escracho, alegria e liberdade estética. Vivemos na capital do país, que sustenta o maior número de assassinatos por homofobia. Somos o décimo-segundo país do mundo em feminicídios. O mesmo Brasil que segue com o extermínio da população negra e pobre (entre jovens, por exemplo, são assassinad@s 7 negr@s para cada branc@). Por tudo isso decidimos levar às ruas nossa troça de sobreviventes e celebrar a nossa existencia.

1° Saída do Bloco das Perseguidas, em 20/01/2013. Foto de Srta. Bia no Flickr em CC, alguns direitos reservados.
1° Saída do Bloco das Perseguidas, em 20/01/2013. Foto de Srta. Bia no Flickr em CC, alguns direitos reservados.

Enquanto tivermos vida, seguiremos livres e felizes. Se muito fazemos coletivamente para construir uma nova sociedade, ao nos adaptarmos ao espaços pré-estabelecidos por este mesmo sistema que nos combate, vamos construir nossos próprios territórios. Vamos viver nossa própria linguagem… e semearemos prazeres, felicidades e cores por toda a cidade.

Vamos ressignificar a violência que sofremos, vamos responder com nosso desejo de mudança, vamos lutar e abrir o jogo. Os assassinatos, espancamentos, estupros, calúnias e difamações, cerceamentos, muitas vezes, justificados pela defesa da “moral e dos bons costumes”. Sim, nos parece assustador que imperem estas práticas de maneira permissiva em nossas ruas, escolas, bares, lares… E inclusive, nas esferas de poder público. Sim, esta cultura nos assusta, mais que isto, nos indigna! E como resposta temos que fortalecer nossa contra-cultura que vai tomar as ruas, as passarelas subterrâneas, vai passar nos Eixos.

Sabemos também que estas práticas pretendem nos silenciar, amedrontar, sondar, perturbar, exterminar. Esse é nosso bloco-resposta: Perseguidas! As resistências que construímos quotidianamente… Temos a convicção e a coragem de reivindicar nossos imaginários, corpos, a cidade …e o carnaval! Todo este espetáculo também é nosso. É chegada a hora de soltarmos nossas fantasias numa retomada: muito caldeirão vai ferver, vamos pintar, cantar, tocar e sambar. Enquanto sobrevivermos vamos auto gerir nossos destinos e responderemos com mais coragem, plumas e paetês.

Se você não gosta de carnaval porque se sente insegura, se você não sai as ruas porque tem medo de ser violentada, de ficarem te secando, de se sentir invadida, podemos sair juntas. Essa é a proposta de um carnaval feminista, libertário e inclusivo. Além do Bloco das Perseguidas, outros blocos feministas sairão pelo país clamando por igualdade e liberdade. E como nosso samba reza: mexeu com uma, mexeu com todas!

Confira a lista de blocos feministas que encontramos e se quiser indicar mais algum é só avisar nos comentários:

Brasília

  • Bloco das Perseguidas. Sai dia 10/02, da Pracinha da 201 norte em direção ao Pacotão! Mais informações: evento no facebook.

Fortaleza

  • Bloco Adeus Amélia. organizado pela coordenadoria de mulheres da Secretaria Municipal de Cidadania e Direitos Humanos, foi criado com o objetivo de alertar sobre a problemática das relações desiguais entre mulheres e homens, predominantes na nossa sociedade, entendendo a cultura e suas diversas manifestações como canal de reprodução de saberes, conhecimentos, mas também de discriminações. Saiu no dia 02/02. Mais informações: Blog do governo do estado do Ceará.

Manaus

  • Bloco Maria Vem Com as Outras. Trata-se de uma realização do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher (Cedim) e diversos outros segmentos favoráveis às políticas públicas de gênero. Sai no dia 08/02. Mais informações: Portal do estado do Amazonas.

São Paulo

  • Bloco da Dona Yayá. Tradicional bloco feminista de Sâo Paulo. Nasceu dentro da União de Mulheres do Município de São Paulo. Foi pensado para chamar a atenção para a Casa da Dona Yayá, desocupada desde a década de 60 com a morte de sua mais famosa moradora e caracterizada como patrimônio histórico desde a década de 70, e incentivar a discussão de seu uso pela comunidade. Saiu no dia 03/02. Mais informações: Blog Bloco da Dona Yayá.
  • Bloco Afro Ilu Oba De Min. É um bloco só de mulheres na percussão e tem vários projetos inclusivos com mulheres, adolescentes e população de rua. Sai dias 08 e 10/02. Mais informações: Página do grupo no facebook.
  • Bloco Adeus Amélia. O propósito é divertir e ao mesmo tempo chamar a atenção para a necessidade de discutir e resolver os graves problemas que as mulheres ainda enfrentam. Sai dia 08/02. Mais informações: Tumblr Machismo Chato de Cada Dia.

Recife

  • Bloco Nem Com Uma Flor. promovido pela Prefeitura do Recife, foi criado para conscientizar os foliões a não usar de violência contra a mulher durante o Carnaval, além de divulgar os locais dos serviços de atendimentos. Ele sai às ruas na quinta-feira da semana pré-carnavalesca. Sai dia 07/02. Mais informações: Portal Pernambuco.
  • Bloco do Laço Branco. Homens pelo fim da violência contra a mulher. Sai no dia 07/02. Mais informações: Site do Instituto Papai.

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*Versão da música “ô abre alas” de Chiquinha Gonzaga.