Posei nua e daí?

Texto de Anne Mantovani.

Suicide Girls é um site/agência de modelos que tem uma filosofia que me agrada. Lá eles mostram o nu fora dos padrões sociais com tatuagens, cabelos coloridos, piercings, modelos acima e abaixo do peso, etc. Este site tem tanta repercussão que alguns amigos me apelidaram de Suicide porque tenho tatuagens e, por causa disso, tive vontade de fazer parte da equipe.Eu viso fama, visibilidade, mostrar minha arte…Mas o motivo não importa! Não é para importar.

Combinei com um amigo para fazer as minhas fotos oficiais para o site e ele aceitou. Em contrapartida, ele me propôs posar nua com uma amiga para o portfólio dele. As fotos estão publicadas no site dele. O ensaio não é pornográfico. Tinha apenas eu e minha amiga fazendo uma guerra de travesseiros, vestindo somente capacetes dos Transformers.

Foto de Rafael Coala.
Foto de Rafael Coala.

Depois que estas fotos foram lançadas ao ar, pessoas de má fé começaram a anunciar meu ensaio de forma pejorativa para o meu namorado. Mas o meu namorado já estava ciente desde o princípio e me apoiou neste momento, mostrando-se contra esta postura cruel, não só como meu companheiro ou meu amante, mas como ser humano que não tolera essa injustiça.

Em seguida, a pressão familiar em cima do meu namorado e de mim foi imensa, mas nós tivemos forças para não nos abalarmos com isso. O problema realmente começou quando as minhas fotos começaram a ser divulgadas no whatsapp acompanhadas de injúrias e coisas que tentam por à prova o meu caráter.

Eu sempre nutri pela minha mãe um amor e respeito imensuráveis e quando soube que pessoas estavam fazendo terrorismo mental com ela por causa destas fotos, resolvi defendê-la. Tornei público. Até porque eu desconfio que essa pressão vem dos familiares dela, o que confirma a teoria de que às vezes o seu algoz está dentro da sua própria casa.Independente de ser família ou não, estas pessoas devem responder pelos seus atos porque isso é crime. Eu não medirei esforços para que, quem quer que seja, pague pelo que está fazendo.

Tornei publica a minha revolta e com ela, surpreendentemente, recebi o apoio de várias pessoas que entendem e/ou já passaram pela mesma situação ou situação parecida. Eu não fiz isso no afã de gerar polêmicas e consequentemente gerar visibilidade para mim, mas eu fiz isso porque como aconteceu comigo e várias pessoas, pode acontecer com qualquer um. O nome disso é falta de consciência artística, é falta de respeito ao próximo, é desvalorização do trabalho alheio… São várias premissas.Como eu tenho certeza que tudo isso é fruto de preconceito, estou lutando pra desmitificar o que quer que seja.

Quero mostrar para sociedade que meu corpo não é ofensivo. Que a nudez é a forma mais natural do ser. Quero que as pessoas enxerguem o corpo como arte, ou minimamente, como um simples corpo, sem agregar elementos ou concepções sujas a respeito. E mesmo que seja pornográfico, o sexo é natural.

Sei que isso não será fácil, porque querer todas nós queremos, mas a arte não está desconectada da realidade. Transgredir e questionar faz parte dos princípios da arte. Por isso exponho meu corpo e também novas formas de pensar. Para ser muito sincera, eu tenho pena dessa ignorância que deturpa e se nega a compreender que o que eu fiz é arte. Eu estou muito segura dos meus atos e ainda digo mais, farei novamente.

É claro que estou numa posição privilegiada. Meus pais me apoiam como ser humano e para mim é isso o que importa. Não ligo para o que falam, mas a difamação e a repressão para com a minha família (incluo meu namorado nisso) é crime e isto não vai ficar impune. Estou tomando as devidas providências. Tenho as ferramentas para isso e acho importante que estando nessa posição social de poder fazer algo que eu lute para que isso seja concretizado, justamente para ajudar outras pessoas que passam pelos mesmos conflitos, mas se sentem impotentes.

No mais, fico feliz por não estar sozinha nesta causa e me senti abraçada pelos meus amigos e alguns grupos feministas. Eu percebi, hoje, que eu dei um start numa causa e que não sou mais eu… Somos nós.

Nossos corpos, nossas regras.

Autora

Anne Mantovani é designer de profissão, musicista de dom e modelo nas horas vagas. Soteropolitana da gema, se assim posso dizer, e uma jovem batalhadora, desde cedo, pelos direitos do ser humano. Tem 23 anos e muitas histórias para contar…