Dia 25 de novembro é o Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres.
A Srta. Bia já postou no Groselha, posts falando sobre a data. Com certeza, este ano não será diferente, e com o Blogueiras Feministas, estaremos fazendo blogagens coletivas e tuitaços sobre o tema, nas proximidades da data.
Ano passado eu não participei, mas em agosto, na Caminhada pela Visibilidade Lésbica de BH, conversava com a Niara de Oliveira e com a Barbara Deister , que falavam sobre construir uma agenda de manifestações feministas, em BH, para reunir as pessoas como na Marcha das Vadias, que foi um sucesso (ao menos nestes tempos de manifestações virtuais e poucos encontros reais) ao reunir diversas vertentes dos movimentos feministas, como a Marcha Mundial das Mulheres e jovens que somente conheceram a Slut Walk pela imprensa e pelas redes. E quando elas falaram da data, 25 de novembro, me lembrei que no calendário católico, é dia de Santa Catarina de Alexandria.

Não me recordo como descobri isso, creio que foi na minha penúltima crise religiosa, quando voltei a freqüentar a igreja católica por uns dois anos, sendo parte de grupos de leitura (eu lia os textos bíblicos, ou, quando era comentarista, elaborava os textinhos de introdução aos trechos que seriam lidos). Foi logo depois de ler a história de São Francisco de Assis, contada pelo Nikos Kazantzakis, o mesmo autor de A Última Tentação de Cristo, e também, o Evangelho Segundo Jesus Cristo, do Saramago.
Nesse período, eu acabava acompanhando o tal “calendário cristão”, que narra os santos do dia, os mártires, e tal. E descobri que Santa Catarina, de quem na verdade eu já havia ouvido falar, em um livro da infância, chamado “Meninos sem pátria”, da coleção Vagalume, e sabia que era a padroeira das solteiras, na França, era também uma virgem e mártir (essas, abundam na Igreja Católica), uma sábia, e seria a primeira doutora da Igreja. É considerada a protetora dos estudantes e dos filósofos.
Diante da lembrança, decidi dar uma nova pesquisada, e encontrei novos fatos. Descobri, por exemplo, que na verdade, não foi Catarina de Alexandria a primeira doutora (mulher) da Igreja, mas sim Catarina de Sena (dos 33 Doutores, somente três são mulheres, e TODAS foram proclamadas a partir da década de 70. Pausa para indignação.
Então, outra coisa interessante que descobri foi que a vida de Catarina de Alexandria é extremamente similar à da filósofa Hipatia de Alexandria, que foi recentemente interpretada pela Rachel Weisz no filme “Agora” (título em português: Alexandria), de 2009, dirigido por Alejandro Amenábar.

No link que postei sobre a Santa, é perceptível que a história é muito fantasiosa, e o Martírio de Santa Catarina foi retirado do calendário oficial do Vaticano em 1969, mas ainda é celebrado. Assim, existe, segundo consta, a possibilidade de que Catarina de Alexandria nunca tenha existido, e seja uma versão cristã de Hipatia, essa sim, figura histórica, comprovada por documentos. Nenhuma de suas obras sobreviveu às pilhagens, às fogueiras e à queda do Império Romano, mas os relatos de seus discípulos foram localizados, e narram sobre uma mulher, de origem nobre, filha de um filósofo, que realmente ensinou na Academia, em Alexandria, no mesmo período histórico.
Hipatia foi martirizada, sim, mas pelos cristãos, possivelmente no ano 415. Um dos tais “Doutores da Igreja”, o 20º, é Cirilo de Alexandria, Patriarca, e foi sob sua “administração”, digamos assim, que Hipátia foi martirizada (outro dos doutores é Agostinho de Hipona. Sobre ele, lembro que minha avó era devota de Santa Mônica, que por sua vez, é mãe de Agostinho, que virou Bispo de Hipona e depois, santo e doutor da Igreja. E o Jostein Gaarder, autor de O Mundo de Sofia, e de Vita Brevis, sendo que no segundo, ele conta a história deFloria Emilia, concubina de Agostinho, uma mulher, com quem o jovem teria vivido 12 anos, tido um filho, e que só menciona em uma frase das suas volumosas “Confissões”),
Não seria nada de surpreendente se realmente a figura de Hipátia, uma mulher que não ocupava os papéis tradicionais da época, tenha sido apropriada pela nascente Igreja Cristã, para ser transformada em uma jovem sábia, que no entanto, venerava o Deus Cristão e Jesus Cristo, sendo usada como exemplo de devoção, convição e fé, para a conversão dos povos. E confesso, mesmo para mim, durante muito tempo, foi uma figura sedutora.
Mas, afinal, o que tem em comum essas duas figuras, uma histórica, e a outra, possivelmente mito cristão?
Além de serem mulheres, e estarem à frente de seu tempo, foram, ambas, vítimas de violência. Ambas, em nome de deuses e religiões, privadas de suas vidas.
E ainda hoje, em nome de preceitos religiosos diversos, em todo o mundo, milhões de mulheres são mortas, mutiladas, agredidas, humilhadas, e impedidas de exercer o legítimo direito sobre seus corpos.
No último sábado, diversas marchas pelo Estado Laico aconteceram no Brasil.
Uma das frases que mais se via era: “Mantenham os seus rosários longe dos meus ovários” (e suas variações).

Um dos maiores óbices à legalização de interrupção voluntária da gravidez, ao abortamento legal, são os preceitos religiosos. Mesmo em países onde o procedimento é permitido, muitos médicos e profissionais da saúde se recusam a realizá-lo, em nome de convições pessoais religiosas. No último sábado assisti à uma cerimônia religiosa de casamento católico. Os noivos são médicos. E o celebrante afirmou, na homilía: “O médico católico que comente o crime de aborto está pecando!” (entre outras pérolas). E eu só conseguia morder a língua e me conter para não sair da igreja p… da vida (as limitações da convivência social, da vida famíliar, da conveniência, etc).
Para finalizar, afirmo que escrevo este post pensando nas datas que teremos pela frente, de celebração e de luta. E para lançar uma semente, para que no dia 25 de novembro, façamos novas marchas.
Novas marchas pelo Brasil, unindo as bandeiras que parecem tão distintas, mas que no fundo, são as mesmas: Erradicar a violência contra a mulher. Todas as formas de violêcia. Contra todas as mulheres.
Marchas das Vadias. Marchas das Feministas. Marchas das Mulheres.
Palestras, mesas redondas, que cada núcleo, cada uma, organize, dentro de suas possibilidades, um evento.
E no dia, sairemos todas, para as ruas.

* peço perdão pelos links de Wikipedia, mas não tive outras fontes para santos católicos. E o verbete da Hipátia estava bem completo, pelo que comparei com os outros