A mais ou menos 2 anos eu tive coragem de “sair do armário”. Não gosto muito dessa expressão, mas creio que ela vem a calhar no momento. Depois de passar uma adolescencia inteira envolvida em um processo de culpa por ser uma anormal que não queria ter filhos, e parte da vida adulta tendo que fingir que os desejava, eu conseguir ter a coragem de admitir publicamente que não quero ter filhos. Esse grilhão que me acorrentava caiu por terra. Esta atitude foi um processo interior libertador, me senti mais livre e leve ao poder falar publicamente daquilo que era tão importante na minha vida, mas juntamente com essa liberdade veio o julgo de todo o dia ser questionada, agredida, humilhada, pela minha decisão de não ter filhos.
Normalmente, as pessoas mais educadas lhe dizem: cuidado você esta chegando perto dos 30, depois dos 35 voce vai mudar de idéia, as pessoas mais invasivas lhe dizem: olha que depois dos 35 é mais dificil de engravidar, você deve engravidar agora, os mais pessimistas dizem: seu marido vai te deixar, casamento sem filho, depois de um tempo vira irmão (filho dá tesão gente?), e por ai vai.. As cobranças familiares são frequentes, as cobranças no trabalho são frequentes, até dentro do movimento feminista, as cobranças estão lá presentes. Porque é facil admitir que uma mulher queira planejar suas gestaçoes, queira evitar, queira deixar para depois, mas incomoda muito ouvir de uma mulher que ela não quer ter filhos, ela não quer gestar ou adotar uma criança. E ai somos catalogadas como mal amadas, mal comidas, odiadoras de crianças, que precisamos ser consertadas, o fato de não desejar ser a mãe de uma criança me coloca automaticamente na categoria de megera maligna sem amor no coração.

Adoro crianças, me divirto muito com alguns filhos de amigas, tenho uma afilhada, acho incrivel o processo de educar uma criança, de acolher e acompanhar o crescimento, ironicamente me dou muito bem conversando com crianças, mas não quero ser mãe, são os meus direitos reprodutivos. Já passei algumas semanas cuidando do filho de 7 anos de um casal de amigos que ficou doente, foram dias no esquema de escola-dever de casa-faz almoço-leva pra la e pra cá-manda pro banho-coloca pra dormir, e foi legal esse período, uma ótima experiencia, se precisassem de mim denovo, estaria lá para ajudar, mas eu não quero ser mãe, eu não serei. E é meu direito dizer isso, e um pouco de respeito seria bom.
Acho a maternidade algo incrivel, algo importante sim, luto e milito para que as mulheres possam ter seus filhos com dignidade, possam ter um parto onde sejam protagonistas do seu corpo, da sua vida, mas não quero ser mãe. Assim como eu, existem muitas mulheres que tem a mesma decisão, mas seguem oprimidas, fechadas, tendo que fingir perante a sociedade dizendo que agora não.. depois sim… Quando na verdade querem dizer: nem agora, nem depois, eu não quero, eu não aceito isso.
A maternidade deve ser uma escolha, jamais uma obrigação. Devemos encarar e refletir que existem mulheres que não querem ter filhos. Dizem as vezes que nós “queimamos o filme do feminismo”, pois já acusam que o feminismo odeia a maternidade e odeia criança e nós autenticamos esse esteriótipo. É triste ouvir isso.
Estamos as vesperas do 8 de Março, Dia Internacional da Mulher, das mulheres, de TODAS as mulheres. Sejam elas mães, ou não. Vamos quem sabe refletir sobre a forma como colocamos as mulheres em categorias, a forma como vemos uma mulher que foge de determinado padrão, e já despejamos uma serie de esteriótipos sobre ela, e procuramos entender “qual o seu problema”, por não ser daquele jeito esperado. Na raiz de toda a questão, creio que esta algo bem direto, simples e complexo, somos mulheres. Nascemos e crescemos sendo doutrinadas para determinado papel. Somos vitimas do preconceito, das humilhações, da violência porque somos mulheres. E para que a engrenagem desta maquina que produz “mulheres aceitas socialmente”, continue produzindo mulheres no padrão, é muito interessante que as próprias mulheres se revoltem contra as mulheres, que as próprias mulheres considerem a mulher “diferente” como doida da cabeça, mal amada, mal comida.
Espero que venha uma era de mulheres cada vez mais livres. Nós “as mulheres que não querem ter filhos”, não devoramos bebezinhos ok? Algumas mulheres dizem sim, eu quero ter um filho, outras dizem não! São decisões legitimas. Respeite!