Texto de Bia Cardoso.

“Lepra da sociedade, puta neguinha, sapatona e vocês têm que morrer”. Essas foram as palavras ouvidas por vítimas de agressões lesbofóbicas, na madrugada da última sexta-feira de fevereiro, na saída do Balaio Café, um conhecido estabelecimento LGBT em Brasília/DF. Quatro meninas, todas lésbicas, foram agredidas e uma delas está internada num hospital.
Na mesma semana, duas mulheres foram espancadas por um homem no Setor Comercial Sul, no centro de Brasília, na hora do almoço. As jovens de 22 e 24 anos, almoçavam em um restaurante quando dois homens pediram para dividir a mesa. No momento em que uma delas se levantou para se servir, o agressor teria dito: “Fala para sua amiga ‘sapatão’ que ela tá pagando cofrinho”, o que gerou bate-boca e fez com que as amigas mudassem de mesa. Assim que saíram do restaurante, perceberam que estavam sendo perseguidas pelo homem, até o momento em que foram agredidas. Por trás, o homem teria empurrado uma delas no chão. Foram chutes e socos até que ela ficasse desacordada. Uma delas teve o osso da perna esquerda quebrado, a outra fraturou o braço e passou por uma cirurgia. A jovem conta que, apesar de se um local de grande movimento, ninguém tentou impedir as agressões.
Dois casos gravíssimos na mesma semana fizeram muitas pessoas se perguntarem: o que está acontecendo? Mais grave ainda é saber que, no caso que ocorreu num lugar de grande circulação de pessoas na cidade, ninguém interferiu para cessar as agressões. A violência contra a mulher é um tema que está presente em diversas campanhas no país, mas ao ver casos como esses percebemos que a sociedade ainda se sente no direito de “ensinar respeito as mulheres na base da porrada”.
Em nota, o Conselho Regional de Psicologia do Distrito Federal – CRP/DF defende a rápida apuração e responsabilização por parte das autoridades competentes:
Às vésperas de março, quando comemoramos e damos visibilidade à luta de mulheres – tantas e diversas – por reconhecimento de sua autonomia, o Conselho Regional de Psicologia do Distrito Federal vem a público expressar seu completo repúdio aos casos de agressões sofridas por mulheres, especialmente negras e lésbicas, noticiadas esta semana no Distrito Federal.
Infelizmente, é sabido que tais fatos não são isolados, considerando que muitas – que não acessam a justiça ou os meios de comunicação – sofrem violências veladas e silenciadas, seja pela falta de poder econômico, seja pela falta de poder político, por não serem brancas, por serem lésbicas, por serem trans, por serem, enfim, mulheres.
Os Movimentos Sociais do Distrito Federal também divulgaram nota, questionando as ações do governo local para combater esse tipo de violência:
O descaso do Governo do Distrito Federal, que sequer se pronuncia sobre muitos dos casos de violência discriminatória no DF, se configura como um desrespeito às pautas de Direitos Humanos e à luta dos movimentos sociais. No ano passado, o Governador revogou, horas depois de sua publicação, a regulamentação da lei que punia administrativamente a homofobia.
O Distrito Federal é uma das unidades da federação em que mais se registra agressões físicas à população LGBT. Além disso, o GDF possui uma Coordenadoria da “Diversidade Sexual” instituída à Secretaria de Justiça Direitos Humanos e Cidadania (SEJUS/DF), que pouco faz pela comunidade LGBT. Estes organismos precisam apresentar com urgência uma proposta de ação e medidas cabíveis para enfrentar esta violência.
A Marcha das Vadias do Distrito Federal em sua nota sobre o caso relata mais agressões que ocorreram na Delegacia, no momento do registro da ocorrência:
A violência vivenciada no estabelecimento foi intensificada na própria Delegacia de Atendimento Especializado à Mulher (DEAM), quando os pais de uma das garotas agrediram verbalmente a namorada da filha por ser negra e lésbica – a “pior companhia e pessoa sem alma”! As garotas convivem com a lesbofobia em suas próprias casas! Uma delas teve sérios ferimentos na cabeça e passa por exames para descartar a hipótese de hemorragia intracraniana.
Muitas vezes, as agressões acontecem em locais públicos e de bastante movimento. Ainda assim, na maioria dos casos ninguém que presencia a violência é capaz de reagir, de inibir o agressor ou se mobilizar com outras pessoas para impedir tamanha brutalidade. No Rio de Janeiro, no dia 14 de fevereiro, um casal de lésbicas foi agredido no meio da Lapa sem qualquer reação das pessoas que por ali passavam. E, assim, a sociedade se omite! As violências continuam sendo naturalizadas! As vozes de quem apanha e sofre permanecem caladas.
A lesbofobia é uma das faces perversas da violência contra as mulheres. A agressão é justificada não apenas pela vítima ser mulher, mas também por não se alinhar aos padrões heteronormativos. Para essas mulheres não é permitido amar sem medo.
O Balaio Café é um local de resistência, encontro e celebração da diversidade na cidade de Brasília. Há alguns anos, o local vem sofrendo ataques machistas, lesbofóbicos e racistas em suas paredes, por meio de pichações. Como resposta, desde o ano passado foi organizado o Bloco das Perseguidas, que esse ano saiu justamente no dia 02 de março, alguns dias após esses casos de violência. Nossa resposta é a resistência, é seguir na luta. Lesbofobia não passará!
[+] Coordenação de Diversidade Sexual emite nota de repúdio contra casos de homofobia.