Movimento feminista sofre perseguição na Turquia

Texto de Maíra Kubik Mano.

O Dia Internacional das Mulheres têm sido uma data de reafirmação não apenas da luta contra a opressão, a violência que persiste e a desigualdade cotidiana, mas também da multiplicidade dos feminismos. Insistimos que somos muitas, com pontos de vista diversos e perspectivas de luta diferentes.

E, entre elas, somos também turcas na praça Taksim.

Mulher fala em megafone durante protesto em Istambul, na Turquia. A manifestação ocorre em virtude do Dia Internacional da Mulher. Foto de Ozan Kose/AFP.
Mulher fala em megafone durante protesto em Istambul, na Turquia. A manifestação ocorre em virtude do Dia Internacional da Mulher. Foto de Ozan Kose/AFP.

O local tem sido palco de protestos desde 2013, quando o governo anunciou que iria destruí-lo para a construção de um shopping center e um prédio militar. Assim como os 20 centavos de São Paulo, o que começou como uma ocupação contra o fim da praça tornou-se uma mobilização muito maior.

Junto com as Jornadas de Junho no Brasil, as Indignadas da Espanha, os levantes na Grécia e o Occupy Wall Street, as pessoas que se manifestam em Taksim têm sido colocadas na relação de movimentos internacionais que emergem como novas formas de politização e contestação de uma democracia que de universal não tem nada. E as mulheres estão lá, no meio das barricadas, protagonizando lutas que têm pautas tão amplas e difusas como os feminismos atualmente.

A carta abaixo, assinada pelo Coletivo Feminista de Istambul, relata a perseguição sofrida por elas e o processo de retrocesso de direitos que está em curso no país. O documento foi escrito antes do 8 de março desse ano e previa um enfrentamento com a polícia que, de fato, acabou ocorrendo. Divulgá-lo é responder ao pedido de solidariedade internacional delas.

Como dizem as companheiras turcas: persistimos na revolta, persistimos na liberdade!

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Nós, as mulheres, vamos estar em Taksim, Istambul, no 8 de Março!

Há 11 anos, a cada 8 de março, nós, mulheres da Turquia, fazemos uma marcha. Expressamos em voz alta nossa luta contra o patriarcado, a violência dos homens, o sexismo, o heterosexismo, o capitalismo, o militarismo e a guerra.

Desde 8 de março do ano passado, vivemos um período em que a violência contra a mulher tem crescido.

A cada dia lemos sobre o assassinato de mulheres nos jornais. Todos os dias três mulheres são mortas na Turquia e os assassinos e estupradores ficam sem nenhum tipo de punição. Ao governo interessa mais tentar evitar divórcios do que evitar qualquer tipo de violência contra as mulheres.

O Partido Justiça e Desenvolvimento (AKP), que é ao mesmo tempo o governo, o legislativo e o poder judiciário, nos tirou o direito ao aborto. Agora nós somos mandadas embora dos hospitais públicos. Eles também têm limitado a obtenção de métodos contraceptivos. O governo não hesita em avançar cada vez mais no controle dos corpos das mulheres. Eles estão preparando leis que irão nos condenar a trabalhos flexíveis e precários. Os abrigos e centros de apoio para as mulheres são poucos e insuficientes. O governo acabou com o Ministério da Mulher e formou um Ministério da Família e de Políticas Sociais. Esse novo mistério transformou os abrigos e centros de apoio em lugares para proteger a família e obrigar a mulher a permanecer com ela, ainda que sua vida esteja em perigo.

Imagem: Coletivo Feminista de Istambul.
Imagem: Coletivo Feminista de Istambul.

Nós, como as mulheres que estiveram nas ruas na resistência de Gezi, desafiamos as políticas sexistas do Estado. Fomos vítimas diretas do abuso e violência da política. Essa, porém, não foi a primeira vez. As mulheres encararam a violência da política nas celebrações do 8 de março de 2005 em Beyazit. O Estado turco foi condenado pela Corte Europeia de Direitos Humanos por esse ataque.

Taksim, onde as mulheres de Istambul continuam resistindo e existindo, apesar da violência policial e de todas as ameaças, repetindo que “nós não vamos sair das ruas, nem à noite”, agora está sob bloqueio policial.

Nessas ruas, nós estamos há 11 anos gritando para o mundo pela liberdade das mulheres e agora estamos ameaçadas pela violência policial, o assédio e bombas de gás para o próximo 8 de março.

A opressão tem aumentado, mas nós não vamos desistir de resistir e nos revoltarmos contra o patriarcado! Assim como tem sido pelos últimos 11 anos, nós estaremos em Taksim, no 8 de março, para a nossa passeata.

O governo do AKP, que está nos atacando em todos os campos da nossa vida, agora tenta tirar as ruas pelas quais caminhamos. Mas apesar de todas as proibições, nos encontraremos em Taksim e levantaremos nossas vozes.

Chamamos as mulheres de todo o mundo para gritar por nossa liberdade, gritar contra a violência policial e por solidariedade. Mesmo que não possam estar conosco em Taksim, passarão conosco as barricadas policiais.

Deixem os pais, maridos e a polícia virem!

Persistimos na revolta! Persistimos na revolta! Persistimos na liberdade!

 Coletivo Feminista de Istambul.