E o Plano Nacional de Educação, como vai?

Texto de Daniel C. Rodrigues.

A educação é um campo com grande numero de disputas ideológicas, principalmente quando se trata dos veículos oficiais e obrigatórios, que são formados pelo ensino fundamental e médio. Dentro desta disputa estão tanto setores progressistas da sociedade como os mais reacionários, devido ao campo estratégico e a possibilidade de influência que é possível na educação básica.

A escola, colocada muitas vezes como ponto principal para a construção moral e intelectual do sujeito, sempre foi um espaço de embates. No inicio da industrialização, foi bandeira de luta dos operários para garantir o domínio da “cultura” e fortalecer sua capacidade de luta. No início do século XX, Ford influencia a educação para se tornar um mecanismo preparatório para a indústria, que é intensificada no pós-1970 com o avanço da política neoliberal, que tenta fazer da educação uma ferramenta de preparação rápida para mão de obra especializada e barata.

Na atual onda conservadora que vem se alastrando pelo Brasil, resultado das pequenas, porém significativas mudanças sociais que vem se consolidando nos últimos anos, com o aumento do poder de compra de uma determinada parcela da população e a popularização de certos ambientes que antes eram de uma elite, como por exemplo, os aeroportos e restaurantes. Os reacionários de todos os tipos, em uma tentativa de frear estas mudanças, estão tentando fazer da educação um mecanismo de propagação de seus pensamentos do século XV.

Um exemplo disso é a bancada conservadora da Câmara dos Deputados, formada principalmente pelo setor religioso cristão, que tem feito diversas incursões contra ações progressistas na educação. Além da conhecida história do Kit Anti-Homofobia, no último dia 25 de fevereiro, a bancada fez um novo ataque, agora tentando mudar o Plano Nacional de Educação (Projeto de Lei 103/2012), que é um dos documentos que organiza o currículo nacional brasileiro, onde constam quais serão os itens considerados conteúdos mínimos para a educação.

Crianças e educadores do Movimento dos Sem Terra (MST) protestam no Ministério da Educação, para entregar um manifesto sobre o fechamento de escolas rurais nos últimos 12 anos. Foto de Marcelo Camargo/Agência Brasil.
Crianças e educadores do Movimento dos Sem Terra (MST) protestam no Ministério da Educação, para entregar um manifesto sobre o fechamento de escolas rurais nos últimos 12 anos. Foto de Marcelo Camargo/Agência Brasil.

A tentativa do grupo era retirar o ensino de educação sexual, um dos temas transversais do currículo, e também a identidade de gênero do corpo do texto. A retirada de identidade de gênero do corpo do texto é uma tentativa de retirar a mulher e outras identidades dos conteúdos educativos, já que se não falamos de gênero o padrão dominante se propaga, ou seja, tudo será falado em referência ao homem, que é constituído como o ser “natural” da história. Fomentar a discussão sobre a pluralidade em diversos momentos do ensino, como no ensino de história, literatura e ciências, mostrando o papel da mulher nestas diversas áreas é importante para modificar a visão hegemônica do patriarcado.

Se isso fosse atingido seria muito mais que um simples retrocesso, seria uma derrota amarga para todas as pessoas que lutam por uma educação mais diversa e igualitária. O primeiro Plano Nacional de Educação (PNE) foi elaborado em 1962 pelo Conselho Federal de Educação, atendendo às disposições da Constituição Federal de 1946 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961. O atual PNE está formalizado na Lei n° 10.172, de 9 de janeiro de 2001, prevendo duração de dez anos. Há três anos tramita no Congresso a atual proposta, que prevê aumentar em mais de 10 milhões o número de matrículas no Brasil, além de triplicar as vagas de ensino técnico, elevar o salário de professores, erradicar o analfabetismo e ampliar em 80% o número de doutores titulados a cada ano.

muitas críticas sobre o atual projeto do PNE, especialmente por reduzir a participação do governo federal na concretização das metas estipuladas no documento. Porém, instrumentos como esse, que possibilitam a abertura do currículo são importantes para desenvolver novas formas de ensino, além de incluir temas como a liberdade e diversidade sexual. Por mais que na maioria das escolas a educação sexual seja assunto exclusivo da biologia, o fato de constar no documento oficial permite que professores engajados com a causa possam ensinar de maneira diferente, afinal, o documento referenda a discussão dos temas nas mais diversas áreas do ensino.

Além disso, a retirada de identidade de gênero do PNE pode ser o primeiro passo para a retirada de outros marcadores, como a identidade racial e o ensino de cultura e história da África e indígena, uma vitória recente dos movimentos negro e indígena que pode sofre abalos se a onde conservadora e reacionária que invade hoje o legislativo não for impedida. Fica a reflexão para as eleições que se aproximam.

[+] O Plano Nacional da Educação e o papel da sociedade no processo de sua construção coletiva. Por João Roberto Moreira Alves.

Autor

Daniel C. Rodrigues é estudante de pedagogia, bolsista de iniciação cientifica. Curioso, enriquento, apaixonado, viciado em livros!

+ Sobre o assunto:

[+] O fundamentalismo nosso de cada dia e a política de educação.