Em defesa da Lei 12.845/2013 e do aborto legal

Semana passada tivemos a revogação da Portaria n° 415 do Ministério da Saúde, que regulamentava o atendimento no SUS nos 3 casos de aborto legal e interrupção da gravidez previstos em lei: 1) risco de vida para gestante; 2) decorrente de estupro (ambos legais desde 1940); 3) em caso de feto anencéfalo (permitido desde 2012 por decisão do STF).

Essa foi uma imensa rasteira nos direitos das mulheres. Porque essa portaria atendia direitos estabelecidos pela Lei 12.845/2013 que dispõe sobre o atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual. Uma lei importante para melhorar e ampliar o atendimento a vítimas de violência sexual em nosso país, já que a maioria dos hospitais de referência concentravam-se nas capitais dos estados.

Essa semana, temos a notícia que os fundamentalistas estão cada vez mais mobilizados depois que conseguiram a revogação da Portaria do Ministério da Saúde e querem levar a votação o PL 6033/2013, que revoga a Lei 12.845/2013 usando o ridículo argumento de que: a sanção da Lei provocou uma polêmica na sociedade acerca de estímulo a prática de aborto e que a Câmara dos Deputados votou a matéria desconhecendo o seu conteúdo e a profundidade do seu alcance.

A revogação teve influência direta do líder do PMDB na Câmara, deputado Eduardo Cunha, evangélico e que se auto-intitula “defensor da vida e da família”. Cunha é da igreja evangélica Sara Nossa Terra e um dos líderes da ala rebelde do PMDB. Apesar de o partido apoiar oficialmente o Governo de Rousseff, um grupo capitaneado por Cunha tem votado contra a gestão dela em uma briga principalmente por cargos. Referência: A revogação de portaria sobre aborto desperta o temor da pressão evangélica, publicado pelo site do El Pais em 30/05/2014.

Não podemos permitir mais esse retrocesso. Os direitos das mulheres estão sendo atacados e usados como moeda de troca em ano eleitoral. Esperamos que o governo não se acovarde diante dessas chantagens e garanta o atendimento amplo e irrestrito no SUS as pessoas vítimas de violência sexual.

No primeiro posicionamento sobre aborto desde o início de seu governo, a presidente Dilma Rousseff defendeu a interrupção da gestação por motivos “médicos e legais” e sua realização em todas as unidades do Sistema Único de Saúde (SUS) com serviço de obstetrícia. A presidente sustentou que a lei 12.845, de 1º de agosto de 2013, passou a garantir que o atendimento seja “imediato e obrigatório” em todos os hospitais do SUS. Referência: Dilma defende aborto na saúde pública por motivos ‘médicos e legais’, publicado pelo site O Globo em 04/06/2014.

Ato de repúdio a revogação da Portaria n°415 e contra o PL 6033/2013

Imagem de Aline Valek.
Imagem de Aline Valek.

Sábado, haverá um ato de mobilização em São Paulo contra a revogação da Portaria n° 415 e também contra o PL 6033/2013. Participe! Link para o evento no Facebook.

Data: 07 de junho (sábado). Horário: 14h. Local: Praça da Sé.

Além desse ato, estão sendo organizados twittaços, blogagens coletivas e outras ações por meio das redes sociais. Acompanhe pelo evento no Facebook e pela hashtag #Abortolegal. Há também o tumblr #AbortoLegal que pretende reunir e repercutir informação sobre essa ação.

Vídeo – #Aborto Legal: conheça seus direitos!

Nota em defesa da Lei 12.845/2013, que dispõe sobre o atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual

Aos Deputados, Deputadas e Senadores e Senadoras da República,

Em defesa da dignidade e da vida das mulheres brasileiras!
Contra a violência, o estupro e o abuso sexual!

Repudiamos ataques à Lei 12.845/2003, que dispõe sobre o atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual.

As mulheres, em todas as faixas de idade, são as principais vítimas de violência sexual no Brasil. Na maior parte das vezes são crimes perpetrados por homens próximos, parentes ou amigos da família. Esse crime provoca, muitas vezes, a gravidez indesejada da mulher agredida, o que agrava a violência que esta já sofreu.

A Lei 12.845, de 2013, obriga o atendimento no SUS às mulheres que decidirem abortar quando a gravidez for resultante de um estupro. Esta é, para nós, uma ação humanitária e um direito humano fundamental das mulheres. Contudo, esta semana, parlamentares conservadores exercem pressão sobre o Congresso Nacional para a revogação dessa Lei, o que para nós configura ameaça de violação dos direitos humanos da mulheres e de sua dignidade.

No Brasil, desde 1940, o Código Penal exime de punibilidade o aborto resultante de estupro, mas os serviços de saúde por vezes se negam ou estão despreparados para fazer o procedimento, obrigando as mulheres vítimas de estupro a buscarem formas clandestinas e inseguras de aborto. A lei 12.845/2013 protege as mulheres que necessitam de políticas públicas de saúde e serviços de qualidade. Sua revogação colocará em risco, particularmente, a vida de mulheres mais pobres, em sua maioria negras. De modo especial violará os direitos humanos de adolescentes e jovens vitimas de abuso sexual.

O Estado brasileiro precisa cumprir a legislação vigente, de maneira completa e integral. É de vossa responsabilidade apoiar e acompanhar a implementação da legislação do país.

Pela manutenção integral da Lei 12.845, de 2013 que dispõe sobre o atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual.

Brasília, 4 de junho de 2014

ASSINAM:

1. Abrasco. Associação Brasileira de Saúde Coletiva
2. Anis. Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero – DF
3. Associação Casa da Mulher Catarina – SC
4. CDD. Católicas Pelo Direito de Decidir – Brasil
5. CEBES. Centro Brasileiro de Estudos da Saúde
6. CFEMEA. Centro Feminista de Estudos e Assessoria – DF
7. CEMICAMP. Centro de Pesquisas em Saúde Reprodutiva de Campinas – SP
8. Comitê Estadual de Estudos da Mortalidade Materna – PE
9. CLADEM. Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher – Brasil
10. CCR. Comissão de Cidadania e Reprodução – SP
11. CFESS. Conselho Federal de Serviço Social
12. Cunhã Coletivo Feminista – PB
13. Entre Nós Assessoria, Educação e Pesquisa em Gênero e Raça – SP
14. Grupo de Teatro Loucas de Pedra Lilás – PE
15. Grupo Curumim Gestação e Parto – PE
16. Grupo de Pesquisa sobre Gênero e Masculinidades – Gema/UFPE
17. Instituto Patrícia Galvão – SP
18. Instituto Papai – PE
19. REDEH. Rede de Desenvolvimento Humano – RJ
20. Rede Iluminar de Cuidados às Vitimas de Violência Sexual – Campinas – SP
21. Relatoria do Direito Humano a Saúde Sexual e Reprodutiva – Brasil
22. SOF SempreViva Organização Feminista – SP
23. SOS CORPO Instituto Feminista para a Democracia – PE
24. Superando Barreiras Campinas – SP

Movimentos, Redes , Fóruns e Articulações nacionais e internacionais signatárias:

1. Articulação de Mulheres Brasileiras – AMB
2. Articulação de Mulheres Negras Brasileiras – AMNB
3. Consulta Popular
4. Secretaria da Mulher Trabalhadora da CUT
5. Fórum de Mulheres do Distrito Federal e Entorno
6. Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto
7. Levante Popular da Juventude
8. Liga Brasileira de Lésbicas – LBL
9. Movimento Estratégico pelo Estado Laico – MEEL
10. Movimento de Mulheres Camponesas – MMC
11. Marcha Mundial de Mulheres – MMM
12. Plataforma Brasileira de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais – Dhesca – Brasil
13. Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos
14. Rede de Homens pela Equidade de Gênero – RHEG
15. União Brasileira de Mulheres – UBM
16. União Nacional dos Estudantes – UNE

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