As mídias sociais estão protegendo os homens de menstruação, leite materno e pêlos corporais

Texto de Jessica Valenti. Publicado originalmente com o título: “Social media is protecting men from periods, breast milk and body hair” no site do jornal The Guardian em 30/03/2015. Tradução de Bia Cardoso para as Blogueiras Feministas.

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O Instagram deletou uma foto da artista Rupi Kaur que mostrava um pouco do seu sangue menstrual. Quando a sociedade aceitará os corpos das mulheres?

Absorventes internos ainda são um tabu online. Foto: Autor Desconhecido/Encontrada na Biblioteca de Imagens do The Guardian.
Absorventes internos ainda são um tabu online. Foto: Autor Desconhecido/Encontrada na Biblioteca de Imagens do The Guardian.

Há uma previsível fórmula da mídia para determinar como as imagens online de mulheres devem ser. Seios em biquínis pequenos são legais (geram curtidas, precisamente), mas seios acompanhados de bebês são questionáveis. Mulheres vestindo quase nada é lugar comum, mas se você tiver um tamanho maior que 40, sua conta pode ser deletada. Closes fechados em bundas de mulher e vaginas mal cobertas são agradáveis, desde que essas partes do corpo estejam depiladas.

E agora, em uma polêmica que mais uma vez reúne tecnologia, arte, feminismo e sexo, o Instagram está sob fogo cruzado por ter removido um autoretrato da artista Rupi Kaur, que mostrava uma pequena quantidade de seu sangue menstrual. Aparentemente, estar menstruada viola os termos de serviço do site.

A mensagem geral para as mulheres não poderia ser mais óbvia: imagens sexxxy são apropriadas, mas imagens de corpos de mulheres fazendo coisas que normalmente corpos de mulheres fazem não são. Ou, para explicar de forma mais grosseira: apenas imagens de mulheres com as quais os homens queiram transar, por favor.

Como pontuou Kaur em sua conta no Tumblr, o Instagram está cheio de fotos de meninas menores de idade que são “objetificadas” e “pornificadas”.

“Eu não vou pedir desculpas por não alimentar o ego e o orgulho da sociedade misógina que poderá ter meu corpo em roupas íntimas mas não se sentirá a vontade com um pequeno vazamento”, ela escreveu.

Porque, realmente, é difícil imaginar as mulheres sentindo-se ofendidas por fotos de amamentação, contornos de biquíni despenteados ou sangue menstrual — eventos assim são uma segunda-feira normal para várias de nós. São os homens que os gigantes das mídias sociais estão “protegendo” — homens que cresceram vendo imagens higienizadas e sexualizadas de corpos femininos. Homens que foram ensinados pela cultura pop, pela publicidade e além a acreditarem que os corpos das mulheres estão lá para eles. E, se eles têm que ver uma mulher que é outra coisa que não magra, sem pêlos e pronta para o sexo — bem, traga um copo com água e açúcar.

Como Kaur escreveu: “A misoginia deles está pingando”.

O lado positivo, é claro, é que a própria natureza das mídias sociais tornou mais fácil para as mulheres apresentarem um conjunto mais diversificado de imagens, de como os corpos femininos podem parecer e significar. Selfies, por exemplo — consideradas por alguns como o ápice da frivolidade e vaidade — estão agora sendo elogiadas por acadêmicas e artistas feministas como uma maneira das mulheres “tomarem posse do olhar” e oferecem um novo senso de controle para as mulheres, como sujeitos em vez de objetos.

Quando temos o poder de criar nossas próprias imagens em grande quantidade, nós temos o poder de criar uma nova narrativa — uma que voa de encontro a narrativa que o mainstream gostaria de nos fazer parecer e representar.

A favor do Instagram, a empresa restaurou a imagem de Kaur após protestos — assim como o Facebook mudou suas normas para permitir imagens de “mulheres engajadas na amamentação ou mostrando as cicatrizes após uma mastectomia”. As empresas de tecnologia estão começando a entender que se querem colocar o poder das imagens nas mãos de seus usuários vão ter que ficar tranquilas com as mulheres sendo totalmente humanas — não apenas imagens de um espelho que a cultura pop quer que sejamos.

Quanto às pessoas que estão escandalizadas com os corpos das mulheres e suas funções naturais: Você não tem que “curtir”, mas você vai ter que conviver com isso.