Sapatão Bissexual, prazer!

Texto de Jussara Cardoso para as Blogueiras Feministas. 

Sapatão, sapata, sapatona, caminhoneira, bofinha, fancha, masculina, entendida e outras palavras, são termos que ouço direcionados a mim desde criança. Fui uma criança sapata/sapatinha, sou hoje uma adulta sapatão. Boa parte da minha infância e adolescência, sempre preferia roupas consideradas masculinas. Gostava de brincar, correr, pular e quando estava de vestido não podia brincar com tanta liberdade. Então, odiava usar vestidos e saias. Mas o fato de eu odiar saias porque não me deixavam brincar usando elas, acredito não ter sido considerado por muitas pessoas. A conclusão óbvia era “essa menina vai ser sapatão”, afinal ela se veste “como um menino”. “Veste outra coisa, tá parecendo homem”, deve ter sido a frase que mais ouvi em toda a minha vida.

Anel de coco, camiseta xadrez, cabelo curto com corte “masculino” ou sempre preso, sapatênis, futebol, pelos no corpo, roupas largas e etc. Coisas ligadas a mulheres lidas como sapatão fizeram e fazem parte de quem sou. A sociedade me lê assim mesmo antes de eu me reconhecer com alguma sexualidade. Demorei aceitar o termo sapatão, porque a ideia que passava a mim era de que sapatão é uma mulher que gosta “apenas” de mulheres. E não, o termo está muito mais ligado a leitura que fazem de nós mulheres que não seguem aquilo que é considerado essencialmente feminino (e por isso somos consideradas “masculinas” demais) do que propriamente sobre nossa orientação sexual. Então entendi (demorou mais ou menos uns dois anos) que sim, sou sapatão porque me leem dessa forma e ok!

Se ser sapatão é ser essa mulher que eu sou, então sou sapatão mesmo. Se ser sapatão é ser essa mulher que sempre “tá parecendo homem”, seja na maneira de agir, seja na roupa que está usando, então é certeza que sou sapatão. Se ser sapatão também é gostar de mulher, então sou. A sociedade me lê assim e tá ok, eu tô de boa com essa leitura. Essa sou eu mesma, sociedade, uma sapatão que é capaz de amar mulheres, mas também de amar homens. Sim, apesar da minha aparência, apesar do que as pessoas me apontam, a minha orientação sexual é bissexual. Sou a sapatão mais bissexual que você conhece! A forma com que eu me visto e me coloco no mundo não define minha orientação sexual, sou eu quem defino. Ser sapatão é a forma como eu expresso meu gênero, mas não define com quem eu me relaciono. No mês da visibilidade bi, as sapatão bi também devem aparecer. Sapatão Bissexual, prazer!

Esse texto faz parte da Blogagem Coletiva pela Visibilidade Bissexual: #BlogagemBi.

Créditos da imagem: Jussara Cardoso, arquivo pessoal.