Hoje, a Lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, faz seis anos. O Brasil é o sétimo país com as maiores taxas de feminicídios. Está atrás apenas de El Salvador,Trinidad e Tobago, Guatemala, Rússia, Colômbia e Belize, numa lista de 84 países. E, de acordo com o Mapa da Violência 2012 – Caderno Complementar 1: Homicídio de mulheres no Brasil:
As armas de fogo continuam sendo o principal instrumento dos homicídios, tanto femininos quanto masculinos, só que em proporção diversa. Nos masculinos, representam quase ¾ dos incidentes, enquanto nos femininos pouco mais da metade. Já outros meios além das armas, que exigem contato direto, como utilização de objetos cortantes, penetrantes, contundentes, sufocação etc., são mais expressivos quando se trata de violência contra a mulher.
Entre os homens, só 14,7% dos incidentes aconteceram na residência ou habitação. Já entre as mulheres, essa proporção eleva-se para 40%.
Em todas as faixas etárias, o local de residência da mulher é o que decididamente prepondera nas situações de violência, com maior incidência até os 10 anos de idade, e a partir dos 40 anos da mulher. Esse dado – 68,8% dos incidentes acontecendo na residência – já permite entender que é no âmbito doméstico onde se gera a maior parte das situações de violência experimentadas pelas mulheres. No sexo masculino, a residência, apesar de também ser um índice elevado, representa 46% dos atendimentos.
Por esses dados, percebe-se que as mulheres morrem mais em casa do que nas ruas. Por isso que a violência doméstica é um problema social crônico, que afeta mais mulheres do que homens. A Lei Maria da Penha é uma resposta que o Brasil foi obrigado a dar, depois que Maria da Penha, biofarmacêutica cearense, conseguiu levar seu caso para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (OEA), que, pela primeira vez, acatou uma denúncia de violência doméstica.
[+] Maria da Penha: A mulher que sobreviveu à tentativa de assassinato pelo marido e virou nome de lei.
O processo da OEA condenou o Brasil por negligência e omissão em relação à violência doméstica. Uma das punições foi recomendar que o país criasse uma legislação adequada para coibir esse tipo de violência. A partir daí, várias entidades se reuniram para construir um anteprojeto de lei definindo formas de violência doméstica e familiar contra as mulheres, estabelecendo mecanismos para prevenir e reduzir este tipo de violência, como também prestar assistência às vítimas. Essa é a gênese da Lei Maria da Penha.
A Lei Maria da Penha criou mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher e permitiu a promoção de várias mudanças no que diz respeito à proteção às vítimas de violência doméstica e à punição dos seus agressores. Porém, há muito para ser feito.
[+] Observatório Lei Maria da Penha
Muitas vezes, a violência doméstica é justificada pelo comportamento da vítima ou banalizada, como é muito comum acontecer na publicidade. Altos níveis de feminicídio, frequentemente, vem acompanhados de elevados níveis de tolerância da violência contra as mulheres e, em alguns casos, são o resultado da dita tolerância.
A Lei Maria da Penha tem alcançado resultados positivos, mas é preciso acabar com o preconceito, especialmente de juízes e profissionais do direito e da lei, que consideram a violência doméstica banal. Ações da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) são importantes para envolver as diversas esferas do Estado nessa questão. Os juizados especiais de violência doméstica precisam ser implementados em todo país. Ainda falta muito para que o atendimento em casos de violência doméstica seja efetivo e decente.
Os dados gerais de violência doméstica com foco na mulher, costumam invisibilizar grupos minoritários como lésbicas, transexuais e negras. Ou são poucos os estudos com foco nesses grupos ou não existem. A Lei Maria da Penha também atende lésbicas em casos de violência doméstica por parte da família ou da companheira. Assim, como também contempla mulheres trans*. Porém, para as mulheres trans* o atendimento pelo Estado é extremamente complicado e preconceituoso, especialmente quando não passaram pelo processo de mudar os documentos. O que só dificulta ainda mais as denúncias de agressão por parte da família ou de companheir@s.
[+] Mulheres negras vítimas de violência doméstica conjugal (.pdf), artigo de Miriam Lucia dos Santos.
[+] New research into domestic abuse against trans people.
[+] We Are the Dead: Sex, Assault, and Trans Women.

A última ação da SPM é uma parceria com o Ministério da Previdência Social, o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) e o Instituto Maria da Penha. O INSS passará a cobrar dos agressores o ressarcimento de despesas com benefícios pagos às vítimas de violência doméstica.
Chamada de ação regressiva, a mudança pretende diminuir os casos de agressão atingindo o bolso de quem comete esse crime. Até então o INSS apresentava esse tipo de ação à Justiça em acidentes de trabalho e de trânsito. A partir de amanhã, a regra incluirá os gastos com aposentadorias de mulheres por invalidez, pensão por morte e auxílio-doença quando for comprovado que foram vítimas de agressão.
Caberá ao INSS analisar cada um dos casos que chegarão através de delegacias da Polícia Civil, Ministério Público ou depoimento das próprias mulheres. O valor do reembolso que o agressor terá que pagar à Previdência dependerá da quantia e do tempo do benefício concedido à vítima ou sua família. Referência: Lei Maria da Penha: Agressores terão de ressarcir o INSS.
Hoje, também será lançada a campanha: “Compromisso e Atitude pela Lei Maria da Penha – A lei é mais forte”. Governo federal e sistema da justiça unem esforços com o objetivo de dar celeridade aos julgamentos dos casos e mobilizar a sociedade brasileira para o enfrentamento da violência contra as mulheres.
A Campanha “Compromisso e Atitude pela Lei Maria da Penha – a Lei é mais forte” tem como objetivos: envolver o sistema de Justiça, Ministérios públicos, Defensorias públicas, Executivo federal e estadual no enfrentamento à impunidade, bem como no esforço de responsabilização de agressores e assassinos de mulheres no país; mobilizar profissionais e operadores do Direito para a compreensão da magnitude do fenômeno da violência doméstica contra as mulheres; e envolver a sociedade no debate sobre a impunidade e a violência doméstica. Referência: Lançamento de Campanha pela Lei Maria da Penha em Encontro que reunirá 400 delegadas.
A violência contra a mulher não é a vida que a gente quer. Durante essa semana, publicaremos outros textos sobre a Lei Maria da Penha, mas você pode conhecer mais sobre vários aspectos da lei em vários textos que já publicamos:
- Não somos (seremos) vítimas. Camilla Magalhães explica porque o conceito de vitimização não combina com o feminismo e nem com a Lei Maria da Penha.
- A decisão do STF sobre a Lei Maria da Penha e as vitórias a serem comemoradas e Dilemas – decisão do STF sobre a Lei Maria da Penha e a autonomia da vítima. Niara de Oliveira e Renata Oliveira discutem e comentam a decisão do STF que declarou a constitucionalidade da Lei Maria da Penha.
- Blogagem Coletiva – Lei Maria da Penha. Ano passado organizamos uma blogagem coletiva para comemorar os cinco anos da lei. Nesse post há uma compilação de todos os textos participantes.
- Os lírios não nascem da lei. Tica Moreno comenta que a conquista da lei não significa automaticamente o fim da violência.
- Por que a Lei Maria da Penha é importante? Texto meu, sobre a violência de gênero.
- A violência contra a mulher e a vitimologia. Renata Oliveira fala sobre vitimologia e ciclos de violência no contexto da Lei Maria da Penha.
- Lei Maria da Penha: a proteção na prática. Renata Oliveira comenta detalhadamente alguns aspectos da Lei Maria da Penha.