Ele me ameaçou por telefone e depois veio até minha casa

Recebemos essa semana mais um relato de violência contra uma mulher por parte de um ex-companheiro. Publicamos e divulgamos porque muitas pessoas encontram-se nessa situação: ameaçadas e sem apoio, seja da sociedade ou do poder público. Nesse caso, trata-se de uma mulher negra, o que acarreta outras formas de opressão e desrespeito. Além disso, há sempre quem julgue as mulheres vítimas de violência, sem ter a empatia de pensar o quanto essa é uma situação difícil e complicada, que envolve diversas questões.

Estamos em ano de eleição e a violência contra a mulher não é um dos temas principais do debate, isso mostra o quanto ainda precisamos lutar para que a sociedade enxergue o quanto isso é prejudicial para a vida de tantas pessoas.

O relato é anônimo porque a pessoa teme represálias.

Foto de Professor Bop no Flickr em CC, alguns direitos reservados.
Foto de Professor Bop no Flickr em CC, alguns direitos reservados.

Na sexta, 12/09/14, ele me ameaçou por telefone e depois veio até minha casa, por volta das 10 da manhã. Transtornado, me agrediu e me manteve durante cerca de duas horas sob ameaça de depredar a minha casa (quebrou copos e danificou um notebook avaliado em R$ 3mil, além de atirar coisas no chão e afins). Afirmou que me mataria e me ameaçou com diferentes facas por duas vezes. Me empurrou contra parede, móveis e me hostilizou durante todo o tempo.

Tentei pedir ajuda ao zelador pelo interfone. Ele me impediu desligando o mesmo e mantendo meu celular com ele, desmontado e sem chip boa parte do tempo.

Após a segunda ameaça com faca fui para cima dele, dei alguns socos, puxei a camisa, estourei um terço e joguei no chão os óculos de sol dele. Conseguindo que se controlasse por alguns instantes, mas se recusava a sair da minha casa. Chegamos a conversar até que ele se exaltasse de novo.

Consegui colocá-lo para fora. Por volta das 11h, os vizinhos começaram a interfonar por causa dos gritos e perguntando se precisava de ajuda. Envergonhada disse que era só uma briga.

Ele ainda me ligou diversas vezes depois entre ameaças e pedidos de desculpas. Chegou a ir até a porta da escola do meu filho.

Aconselhada por meus amigos liguei para policia e fui orientada a me dirigir a um pronto socorro para exame de corpo delito. Lá fui tratada com deboche e total descaso pela medica que fez um laudo alegando que não ouve lesão corporal (ela nem ao menos tocou em mim). Se fosse branca, estaria coberta de hematomas, mas como sou negra…  não haviam hematomas.

No 1º Distrito Policial de Diadema fui humilhada pelos funcionários presentes com frases como “vocês mulheres acham que fazer um b.ozinho resolve alguma coisa”, “numa briga o cara vai te ameaçar, não te chamar para ir a missa”, “b.o não resolve nada. A gente não vai sair daqui e ir atrás do cara”, “tá aqui que não houve lesão corporal, não posso fazer nada”, enquanto riam de mim.

Pela ameaça com faca, segundo o delegado, configura a Lei Maria da Penha. Não pude incluir no boletim que ele quebrou coisas na minha casa nem as ameaças por telefone. Feito o boletim perguntei ao escrivão o que aconteceria depois já que era Maria da Penha e, para minha surpresa, ele disse: “NADA. Você vem aqui no cartório e entra com uma representação contra ele. MAS NÃO VAI DAR EM NADA”.

A policia não vai atrás dele? “NÃO. COM OS MILHARES DE ROUBOS ACONTECENDO POR AI, NÃO VAMOS ATRAS DESSE CARA”.

Nem preciso dizer que todas as informações foram dadas com total má vontade e deboche.

Me senti extremante humilhada e ultrajada. As pessoas agiram como se a culpa da agressão fosse minha. Como se a merecesse. Tudo isso aconteceu porque descobri mais uma traição — tenho todo o direito do mundo de não aceitar ser traída e enganada —, o contestei e ele desligou na minha cara. Então, no dia seguinte fiz postagens no Facebook dele o chamado de mentiroso e comentando em algumas de nossas fotos que ele havia me traído e que não tinha caráter.

Na mesma sexta liguei para ele e pedi desculpas, como também me desculpei para o pai do meu filho (que me abandonou grávida) por ter engravidado.

Escrevo hoje, porque não tenho vergonha e quero que todos saibam que fui agredida e humilhada e não vou me calar. Não vou perdoar meu agressor e esperar a próxima briga para tirar a prova se ele vai tentar me matar de novo. Quero que outras mulheres vejam isso e não tenham vergonha de denunciar nem de se afastar dessas pessoas. Que a nossa sociedade machista veja que nem todas nós vamos abaixar a cabeça para esse tipo de coisa e que todos os homens que me disseram ontem que não iriam julgá-lo pensem nas suas filhas, irmãs e mães que podem passar por isso um dia e quero ver quem vai ficar do lado do agressor.

Ser homem não é trair, não é humilhar nem agredir uma mulher para mostrar superioridade. Tá bem longe disso.

Conto com o apoio de todas as mulheres que verem isso para que seja um exemplo de força pra gente. Espalhem, compartilhem e não se calem. Já que a Policia, não vai fazer nada.