Texto de Mafê para as Blogueiras Feministas.
O histórico jurídico nacional durante muito tempo foi o reflexo fiel de uma conjuntura sociocultural, demarcada por traços patriarcais, que sequer reconhecia a violência contra a mulher como propriamente violência. Não é preciso ir tão além para vislumbrar a presença de leis tendenciosas ao longo de toda história do Brasil, especificamente no âmbito criminal, das Ordenações Filipinas ao Código Penal de 1940.
A criação de uma lei específica para tratar da violência doméstico-familiar contra a mulher, por sua vez, se deu muito tardiamente. Foi fruto da luta de movimentos feministas, da ação de ONGs e da pressão internacional. Em hipótese alguma teve sua elaboração fundamentada na real preocupação do Estado para com a violação dos direitos das mulheres. Do contrário, muitas vítimas foram negligenciadas sob o pretexto de que “em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher”.
Convém ressaltar que, antes de Maria da Penha denunciar o Brasil por tolerância à violência praticada contra a mesma por seu ex-marido, milhares de Marias perderam a vida. E hoje, doze anos após a publicação da lei que carrega seu nome, por que outras milhares continuam perdendo?
São muitos os fatores agravantes da problemática e que, sem dúvida, dificultam a plena eficácia da Lei Maria da Penha – LMP. Entretanto, na busca constante pela erradicação da violência contra a mulher, por vezes, esquecemos do “ponto-chave”: quantas mulheres violentadas diariamente têm conhecimento dessa violência?

Há uma necessidade imediata de conscientização da população acerca das tipificações de violência contra a mulher, dos direitos e garantias previstos nos dispositivos da LMP. Persiste no imaginário popular que violentar significa espancar até provocar ferimentos expostos, um olho roxo e um braço quebrado; ou xingar publicamente, perante todos os vizinhos da rua.
Disso resulta que, sem o devido reconhecimento da violência sofrida – incluindo moral, sexual, patrimonial, psicológica e física – muitas mulheres tornam-se ainda mais vulneráveis e dificilmente conseguem romper com o ciclo de violência no qual estão inseridas. Não se pode esperar que uma mulher denuncie quando ela própria não distingue a sua situação.
Partindo desse viés, convém questionar sobre quantos de nós tivemos, já na educação de base, o acesso a conteúdos voltados para o problema da violência doméstica e familiar contra a mulher, ao passo que, ao chegar em casa, presenciávamos nosso pai mandar nossa mãe calar a boca porque quem mandava ali era ele, sem ao menos compreendermos que aquilo era errado?!
É por isso que nós, enquanto PRIVILEGIADAS desse tipo de instrução, temos o dever para com aquelas que a sociedade não recua ao apontar o dedo e dizer que “gostam de apanhar”, quando, na verdade, são as mulheres que mais carecem de apoio. Devemos informar, desconstruir, estender a mão e o colo. Um ciclo de violência desgasta, intimida, destrói e mata. Pois, como assegurou Harriet Tubman: “libertei mil escravos. Poderia ter libertado outros mil se eles soubessem que eram escravos”.
Autora
Me chamo de Mafê, tenho dezoito anos, sou humana, consciente, feminista e empoderada. Atualmente, estudante de Direito, apaixonada por cérebros pensantes e por tudo aquilo que me faz evoluir.